Título: Só milagre salva Hillary
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 08/05/2008, O Mundo, p. 39

Para analistas, Obama venceu disputa democrata e chances da senadora são ínfimas

Acampanha presidencial de Hillary Clinton acabou, pois a esta altura só um milagre a salvaria. E tudo indica que só mesmo ela ainda acredita em milagres nessa disputa. Tal foi a conclusão a que chegaram ontem, unanimemente, os especialistas no assunto.

Até mesmo conselheiros da candidata admitiram que, mesmo que as regras fossem alteradas em cima da hora, como ela vem pleiteando, de forma a permitir a oficialização dos resultados das primárias realizadas irregularmente em Michigan e na Flórida, Hillary não teria o número suficiente de delegados para vencer.

Apesar disso, ela ontem se fez de cega, surda e muda. Viajou ao estado da Virgínia Ocidental, onde haverá votação na próxima terça-feira, e disse num comício que a luta continua:

- Vou permanecer nessa competição até que um candidato seja indicado - disse ela.

Hillary deixou transparecer seu desespero ao dizer que já teria sido indicada candidata se o seu partido usasse as regras do Partido Republicano - em que o vencedor de uma prévia obtém todos os delegados do estado, e não apenas uma parcela proporcional à votação recebida.

Ela também solicitou doações para continuar na disputa. Sua equipe revelou que nos últimos 30 dias Hillary pôs US$6,4 milhões (R$10,6 milhões) do próprio bolso na campanha. Ontem ela se reuniu em Washington com superdelegados (dirigentes, governadores e parlamentares democratas) para pedir apoio.

Esgotadas as suas chances matemáticas, o esforço dela se concentra no convencimento deste grupo de que ela seria uma candidata mais forte do que Obama. A vitória dele na Carolina do Norte, por 16 pontos percentuais, e a derrota por dois em Indiana, na terça-feira, fizeram com que o senador atingisse o índice estimado de 1.847 delegados (são necessários 2.025 para a nomeação) e ela chegasse a 1.687.

Campanha aposta na tática do medo

Obama, portanto, precisa de 178. E há 217 delegados em jogo nas últimas seis primárias, e 278 superdelegados ainda indecisos. Para ser nomeada, Hillary teria de ganhar 100% dos votos nas prévias, e obter o apoio de 121 superdelegados. Ou seja: um milagre.

Assim que os resultados foram consolidados, Tim Russert, da NBC News anunciou:

- Agora já sabemos quem é o candidato democrata, e ninguém vai discordar disso.

Ao mesmo tempo, David Gergen, ex-conselheiro dos presidentes George Nixon, Ronald Reagan, George H. Bush e Bill Clinton, e atualmente comentarista da CNN, concluiu:

- Acho que o pessoal de Hillary sabe que o jogo está quase no fim.

Bob Frankel, analista político da MSNBC, foi mais incisivo:

- Vamos colocar isso logo sobre a mesa: acabou, acabou!

Hillary sofreu um inesperado golpe ontem. O ex-candidato presidencial George McGovern, um dos criadores do sistema de superdelegados, anunciou que retirava o apoio a ela, passando a apoiar Obama. E sugeriu que Hillary deixasse a disputa:

- Não há como os superdelegados irem contra a vontade popular.

O que poderia Hillary fazer? Há um consenso, tanto dentro do seu partido quanto entre os analistas políticos, de que só lhe resta decidir quando e como sair da disputa. Porém, a julgar por uma revelação feita por Harold Ickes, um dos principais estrategistas de sua campanha, Hillary apelará para a tática do medo. Ou seja: tratar de intimidar os superdelegados, alegando que, às vésperas da eleição, poderiam surgir fatos comprometedores sobre Obama, que causariam a derrota do partido na eleição presidencial.

- Ainda não conhecemos Obama o suficiente, e não podemos nos arriscar a ter uma surpresa em cima da hora. Com Hillary como candidata não teríamos esse risco - alegou Ickes.