Título: Dramática busca por sobreviventes
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 14/05/2008, O Mundo, p. 29
Governo chinês confirma 13 mil mortos e 60 mil desaparecidos
Com seus 11 milhões de habitantes, Chengdu, capital da província de Sichuan ¿ localizada a cerca de cem quilômetros do epicentro do terremoto de segunda-feira, na região de Wenchuan ¿ não parece o cenário de guerra em que se transformaram as pequenas cidades à sua volta, verdadeiros amontoados de destroços, concreto e aço retorcido que mataram quase 13 mil pessoas e ainda escondem, segundo o governo da China, mais de 60 mil desaparecidos. Os prédios estão de pé, há energia elétrica e os hotéis recebem hóspedes normalmente ¿ ao contrário de cidades como Yingxiu, onde soldados encontraram ontem só dois mil sobreviventes na cidade que tinha 12 mil moradores até domingo.
Mas é em Chengdu que se percebe com clareza o coquetel de horror, trauma, solidariedade e urgência que marca Sichuan desde o tremor. Apesar da chuva inclemente que cai sobre a região desde a tarde de anteontem, há centenas de tendas na cidade e várias famílias dormem nos seus carros, estacionados no meio-fio.
Ontem à noite, na rádio FM 91,4 (que transmite 24 horas de notícias sobre o tremor), o Escritório de Geologia e Sismos de Chengdu pedia aos moradores da cidade que tiveram suas casas afetadas pelo terremoto que dormissem em outro local. A razão: há a expectativa de um novo tremor de até 6 graus na escala Richter nas próximas 36 horas.
¿ Nunca vi uma coisa dessas e tudo parece um estado de guerra ¿ diz o motorista de táxi Bai Wu, 27 anos, nascido em Chengdu. ¿ As empresas não estão funcionando porque temem um novo terremoto, só 20% dos postos de combustível estão vendendo gasolina, limitada a 100 yuans por carro, e alguns mercados estão fechados porque os donos temem saques.
A presença do primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, na cidade ¿ de onde coordena um exército de dezenas de dirigentes comunistas, 50 mil soldados do Exército deslocados para Sichuan e milhares de voluntários ¿ fez com que cones fossem espalhados pelas estradas que ligam Chengdu às principais cidades afetadas pelo terremoto. Nestes corredores circulam comboios de carros particulares, liderados por um batedor da polícia, que vão e voltam da área dos tremores levando comida, água e remédios e trazendo feridos em estado grave para os congestionados hospitais da capital.
Assim como nas demonstrações coletivas de patriotismo na defesa da tocha olímpica, os chineses têm um extraordinário senso de mobilização e solidariedade em situações extremas como a vivida hoje por Sichuan. Na rádio, os pedidos de ajuda feitos para quem tem carro e pode ajudar transportando feridos e comida são respondidos com uma fila de veículos na frente do prédio do Escritório de Segurança Pública.
Diante de terremotos, nevascas, ciclones e doenças causadas por vírus exóticos, o governo chinês desenvolveu um esquema rápido de resposta a tragédias que envolvem muitas pessoas, bem diferente do mutismo e aparente imobilismo que caracterizaram a epidemia da síndrome respiratória aguda grave (Sars), em 2003, ou o vazamento químico no Rio Songhua, em 2005. Na segunda-feira, logo após o tremor, a mídia chinesa tratou com discrição a tragédia, mas ontem várias TVs e a internet do país acompanhavam o desenrolar da crise todo o dia.
Em Mianyang, 18 mil soterrados
Quando soldados começam a chegar às áreas próximas ao epicentro do terremoto ¿ que ontem teve a intensidade corrigida para 7,9 graus na escala Richter ¿ cenas de horror aparecem. Só na cidade de Mianyang, há 18 mil pessoas soterradas. Em muitas localidades, só militares pára-quedistas conseguiram chegar, pois as estradas estão destruídas e o mau tempo impede o pouso de helicópteros.
O aeroporto de Chengdu foi reaberto ontem no início da tarde. Às 22h30m, Chen Dahong, 45 anos, funcionário de uma empresa de decoração de casas, desembarcava na capital, onde pretendia tomar um táxi rumo a Chongzhou, distante 17 quilômetros. A casa onde mora sua família ¿ mulher, filho e seus pais ¿ mal se mantém de pé após os tremores.
¿ Minha família está morando numa tenda e a gente precisa salvar o pouco que tem, não? ¿ dizia.