Título: Turbulência no espaço aéreo
Autor: Mendes, Karla
Fonte: Correio Braziliense, 12/05/2009, Economia, p. 28

A redução nas viagens trazida pela crise financeira mundial afetou as companhias brasileiras, que tiveram queda no faturamento. O prejuízo maior foi da Gol, que perdeu quase três pontos de participação

O horizonte para as companhias aéreas não está nada favorável este ano. Em cenário de crise internacional, cai o número de viagens nacionais e internacionais, a lazer e também no mercado corporativo. Com a redução do número de viagens, a concorrência entre as empresas pelo consumidor fica ainda mais acirrada. A entrada da Azul, em dezembro passado, no ápice da turbulência mundial, deixou a situação ainda mais crítica para as companhias que já atuavam no mercado. E quem mais sentiu o impacto foi a Gol, que perdeu quase três pontos percentuais de participação no mercado de dezembro de 2008 a março deste ano, conforme análise feita pelo Correio a partir dos dados divulgados mensalmente pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

Ao longo de 2008, a fatia da Gol no mercado de aviação ficou praticamente estável até junho, na casa dos 37%, 38%, registrando apenas pequenas oscilações. Em julho, levou um tombo para 35,33%, chegando ao fundo do poço em agosto, com 34,13%, mas voltou a registrar crescimento em setembro. A partir de outubro, quando foi dado o aval oficial para a absorção das operações da Varig, a Gol ganhou fôlego até dezembro, mas em seguida os índices ingressaram em períodos consecutivos de retração consecutivos. Sua maior concorrente, a TAM, se manteve como líder do mercado com índices em torno de 48% a 50%, atingiu o topo máximo em agosto, com 54,18%, e a partir de dezembro manteve-se na casa dos 49%. A Ocean Air perdeu muito mercado de janeiro a junho de 2008, despencando de 4,64% para 1,63%, voltou a crescer em julho e depois entrou num período de estabilização, com participação entre 2,5% e 3%. A Webjet, por sua vez, registrou índices praticamente estáveis até abril, na casa de 1,5%, experimentou um período de crescimento a partir de maio, registrando recorde de 3,67% em janeiro, com 4,33%, e está se mantendo no patamar de 3,8%. A Azul, está em franca ascensão (veja quadro).

Vantagens Rotas e estruturas mais robustas fizeram a TAM levar vantagem nesse período, na visão de Amarylis Romano, analista do setor de aviação da consultoria Tendências. ¿Pela ótica de mercado, a Gol deveria estar melhor porque, apesar de não ser de fato uma empresa low cost (custo baixo), tem uma ou outra oferta mais agressiva, focando na população de renda média baixa. Mas há quem diga que a incorporação da Varig foi um problema da Gol, sem falar do aumento do custo de combustível e do dólar¿, analisa. ¿Se olharmos para as linhas internacionais, a Gol perdeu muito mais, caindo de 80% para menos de 68,7%¿, ressalta.

A especialista pondera que não dá para dizer que esse será o comportamento do mercado. ¿A minha visão é que tem espaço para todo mundo, mas para as companhias menores, o cenário vai depender, fundamentalmente, do crédito e da massa de rendimentos. Quem tem conseguido vender passagens parceladas vai crescer, mas devem se manter como empresas satélites¿, explica.

Simone Escudêro, diretora de Projetos e Estudos de Mercado da All Consulting, observa que, como a TAM é a única companhia com rotas internacionais fora da América Latina, ela acaba tendo um público diferenciado. O mercado como um todo também tem perdido passageiros por vários problemas nos últimos anos. ¿Houve os acidentes da TAM e da Gol, a greve dos controladores e o caos nos aeroportos. Isso inibe o mercado, pois muita gente deixou de viajar de avião. Em 2008, também tivemos um ano com poucos feriados prolongados e o petróleo nas alturas, o que impacta diretamente no querosene que abastece as aeronaves. Quando começou a melhorar a situação nos aeroportos, com voos sem atrasos, veio a crise internacional e a entrada da Azul¿, comenta.

Simone Escudêro analisa que a estreante está muito agressiva, assim como a Gol, no início de suas operações, oferecendo tarifas com até 75% de desconto. ¿A Gol passou a se adequar ao serviço de bordo com patrocínios, enquanto a TAM está mais focada em outro público. No começo, entrávamos numa aeronave da Gol e não sentíamos diferença em relação à TAM. Hoje, já se sente¿, diz.

Análise da Link Investimentos aponta que, por estar numa posição intermediária entre TAM e Azul, Webjet e Ocean Air, a Gol está numa situação mais vulnerável. Assim, a Gol sofre com queda na demanda e com a concorrência das companhias menores, que focam em passageiros que viajam de ônibus e priorizam o preço da passagem. Simone Escudêro observa que o setor é muito suscetível. ¿A gripe suína vai afetar o setor.Um acidente aéreo também afeta. Foi isso que tirou a BRA do mercado. A mais fraca era a Varig, mas a BRA era a que não se consolidou¿, explica. ¿Acho que qualquer problema que houver no mercado afeta mais as aéreas menores e a Azul¿, conclui.