Título: É a vitória de uma visão conservadora
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 15/05/2008, O País, p. 8

O vice-presidente para América do Sul da ONG Conservação Internacional, José Maria Cardoso, acredita que a saída da ministra Marina Silva representa uma vitória de uma visão conservadora e antiga de se pensar o desenvolvimento do Brasil. Essa visão, segundo ele, que não leva em conta aspectos ambientais, apenas econômicos.

Roberta Jansen

O senhor acha que a saída da Marina Silva é uma vitória do agronegócio?

JOSÉ MARIA CARDOSO: Não, representa uma vitória de uma forma antiquada de pensar o desenvolvimento do país, não necessariamente associada apenas ao agronegócio, mas também a outros setores.

De que forma a posição de Marina ia de encontro a esse modelo?

CARDOSO: O grande desafio da Marina, o que ela tentou implementar no tempo em que esteve no ministério, foi uma política de desenvolvimento que incorporasse não só as dimensões econômicas e, eventualmente, as sociais, mas diversas outras, entre elas a ambiental. Essa era a transversalidade da qual ela falava sempre, uma forma moderna de pensar o desenvolvimento. Os outros ministérios não conseguiram acompanhar essa lógica. Houve a pressão por votos, as pressões políticas, as pressões de vários setores para impor a visão unidimensional do desenvolvimento.

Pode-se dizer então que houve uma derrota clara do seu modelo de desenvolvimento?

CARDOSO: Ela saiu cansada de tentar mostrar o caminho do desenvolvimento moderno e não ser ouvida pelos ministros que pensam em ações a curto prazo, sob pressão de empreiteiras, do agronegócio, da proximidade das eleições, e que não conseguem perceber a importância de incorporar a dimensão ambiental ao desenvolvimento. E essa é uma visão extremamente conservadora, das grandes obras, dos programas de infra-estrutura. Uma coisa antiga que a China faz hoje e que os militares fizeram por aqui na década de 70. Houve um choque entre duas visões, e a mais antiga ganhou.

Que rumos toma a política ambiental?

CARDOSO: Lula já declarou que a política é do governo. Se isso é verdade, o novo ministro vai entrar prestigiado e manterá a política, ou seja, tentará implementar a transversalidade que Marina não conseguiu. Há muitas dúvidas, no exterior, sobre o futuro da política ambiental brasileira. Como a Marina tinha muita credibilidade, vão ter que fazer muitos esforços e ações concretas, para recuperá-la.

A escolha de Minc foi uma forma de reforçar a idéia de que é uma política de governo?

CARDOSO: O Lula colocou um ambientalista, uma pessoa reconhecida internacionalmente, para dizer ao mundo que a política é de governo e que vamos dar continuidade a ela.

Haveria mudança na política em função das diferenças de perfis entre Marina e Minc?

CARDOSO: Marina é uma ambientalista que veio da floresta, com grande foco na Amazônia. O Minc tem mais foco na Mata Atlântica, é mais urbano. O que pode mudar um pouco, a se manter a política do governo, é o Minc dar atenção especial a outros biomas, como Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal, mais ameaçados que a Amazônia.

O foco na Amazônia seria um ponto fraco da gestão da Marina? E o ponto forte?

CARDOSO: Não diria um ponto fraco, mas um motivo de preocupação de ambientalistas que trabalham em regiões mais afetadas e que não receberam tanta atenção. Mas ela tinha uma política clara para a Amazônia e conseguiu fazer muita coisa.