Título: Em dez anos, 19 assassinatos no estado e só um culpado condenado
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 18/05/2008, O País, p. 4
Inquéritos não avançam porque testemunhas têm medo de depor, diz polícia
Em dez anos, 19 vereadores foram assassinados no Estado do Rio. Seriam 20, certamente, se o irmão de Sebastião Ferreira da Silva, o vereador Chiquinho Grandão, de São Gonçalo, não tivesse atirado um martelo no pistoleiro que alvejava o político na porta de seu centro social, afugentando-o do local. Chiquinho, embora atingido por cinco tiros (dois no abdome, um na perna, outro no braço e o último no tórax), conseguiu sobreviver.
- Minha vida mudou. Gostava de boemia, mas hoje sou caseiro, circulo muito pouco e ando o tempo todo com dois PMs - conta Chiquinho.
O atentado aconteceu em 6 de julho de 2006, quando o vereador visitava as obras de seu centro social, na Estrada do China, no bairro Parque Fluminense. Dois homens chegaram de carro e um deles, após chamar Chiquinho pelo nome, fez os disparos. O irmão e dois rapazes, que estavam num andaime, viram tudo.
Até hoje, passados dois anos, Chiquinho não sabe quem são os autores do atentado. A situação se repete com a maioria dos 19 assassinatos (12 na Baixada Fluminense, dois no Rio, três em São Gonçalo, um no interior e outro da Região dos Lagos). Embora algumas das vítimas colecionassem inimigos, inclusive com queixas registradas em delegacia, os inquéritos nunca são concluídos.
Apenas dois inquéritos resultaram em processos
Disputa de vagas, brigas entre grupos políticos, fraude, grupos de extermínio, máfia do lixo e vingança estão entre as supostas causas dos crimes. Do total, apenas dois inquéritos se transformaram em processo. Só um resultou em condenação do executor do crime.
Não é fácil encontrar o paradeiro das investigações. Dois crimes ocorridos em Belford Roxo e um assassinato em Magé, por exemplo, foram investigados pela Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense (DHBF), que não localizou os inquéritos em seus arquivos. O delegado titular, Ruchester Marreiros, explicou que a unidade não conta com sistema informatizado, o que obriga os agentes a procurar cada inquérito manualmente, nos livros de registro.
Apenas a investigação da morte do vereador Luiz Carlos Aguiar, assassinado em 2002, em Parada de Lucas, no Rio, teve um desfecho. Dias depois do crime, a polícia prendeu temporariamente dois suspeitos. Um deles, Cléber Luiz de Oliveira, foi condenado a 16 anos de prisão.
A Câmara de São Gonçalo concentra três dos casos sem solução pela polícia, que atribui parte da dificuldade do trabalho ao grande número de inimigos políticos das vítimas e ao medo das testemunhas de prestar depoimento.
A ousadia dos executores fez da porta da Câmara local cenário de uma dessas mortes: o vereador Carlos Lopes da Silva, o Carlinhos da Marmoraria, levou nove tiros, disparados por um motoqueiro, quando saía de uma sessão, falando ao celular, em 2003. O político fizera diversas denúncias ao Ministério Público sobre pessoas que estariam interessadas em sua morte. Carlinhos, como outros colegas de profissão, andava armado e tinha fama de truculento. Ele teria ligação com a guerra das vans em São Gonçalo.
Os outros dois assassinatos no município são marcados por uma coincidência. José Benjamim Sobral, o Beija, morto em 1998, e Luís Carlos da Silva, o Luís do Posto, assassinado em 2003, foram substituídos pelo mesmo suplente: Edilson Gomes.
Delegado reclama da lentidão de operadoras
A Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense investigou, pelo menos, seis desses crimes. O delegado Ruchester relata que a demora das operadoras de telefonia em passar informações sobre ligações requisitadas pela Justiça atrasa o andamento dos inquéritos:
- Tem operadora que demora um ano para mandar as informações. Isso vai esfriando o trabalho e dificultando a descoberta do paradeiro das pessoas.