Título: Ministro do STF não deixa Aparecido se calar
Autor: Brígido, Carolina ; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 16/05/2008, O País, p. 15

Ex-funcionário da Casa Civil acusado de vazar dossiê sobre FH tem pedido para ficar em silêncio em CPI negado

Carolina Brígido e Maria Lima

BRASÍLIA. O ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou pedido de habeas corpus preventivo feito pelo ex-secretário de Controle Interno da Casa Civil José Aparecido Nunes Pires, apontado como responsável pelo vazamento do dossiê com gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Aparecido queria a garantia de permanecer calado durante depoimento na CPI do Cartão Corporativo, previsto para terça-feira, e não ser preso por isso. Ayres Britto argumentou que, como o direito de ficar em silêncio é constitucional, não haveria motivos para o STF concedê-lo. A não ser que a CPI estivesse ameaçando desrespeitar esta garantia - o que, para o ministro, não ocorre.

Aparecido, que já recorreu da decisão ao plenário, também pediu para ser acompanhado por um advogado no depoimento e que o STF garantisse seu depoimento como investigado, e não como testemunha. Dessa forma, não seria obrigado a fazer juramento para dizer somente a verdade. E, se mentisse aos parlamentares, não poderia ser preso em flagrante. Aparecido também queria garantir que não seria obrigado a participar de eventual acareação com outros envolvidos com o caso dossiê.

- Deixei claras as garantias constitucionais e processuais penais de todo aquele que depõe numa CPI. Mas não posso presumir uma coação. Se surgir o risco, se houver ilegalidade ou abuso de poder de modo a cercear a liberdade de locomoção, um novo habeas corpus deve ser impetrado - disse o ministro.

A negativa do ministro foi vista com alívio no Congresso, uma vez que seu pedido ao STF gerou desconfiança. Até o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), lamentou a postura de Aparecido:

- É lamentável, diante da responsabilidade que esse funcionário tem nesse acontecimento. Pensei que ele não tivesse nada a temer.

Já a líder do PT, senadora Ideli Salvatti (SC), considerou legítimo o pedido de Aparecido:

- Em várias outras CPIs, isso ocorreu.

Nos bastidores, nada de problemas para o Planalto

O ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, negou que o pedido de habeas corpus de Aparecido fizesse parte de uma estratégia para blindar a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). Ele disse que o governo tem todo o interesse de que ele fale a verdade:

- Não tem que blindar a ministra Dilma, que ele fale. É um direito dele (de recorrer ao STF). Tem que respeitar. A sociedade, o Parlamento e o governo desejam que ele deponha. O governo não quer ficar como suspeito de ter feito isso (o dossiê). Isso não ajuda a ninguém.

Mas, nos bastidores do governo, os operadores políticos do presidente Lula estão seguros de que, no depoimento à CPI, Aparecido não criará problemas para o Planalto e ficará restrito à sua defesa. O pedido dele ao STF foi, no entendimento do governo, o principal sinal de que ele deixou de lado o tom beligerante da semana passada, quando mandou recados de que iria à CPI para revelar detalhes como foi elaborado o dossiê e que obedeceu uma ordem de comando da secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra, principal assessora de Dilma.

COLABORARAM Gerson Camarotti e Cristiane Jungblut