Título: Centenas dão adeus a Zélia Gattai na Bahia
Autor: Barbosa, Paixão
Fonte: O Globo, 19/05/2008, O País, p. 8

Velado em Salvador, corpo da viúva de Jorge Amado será cremado hoje; cinzas vão para a casa do Rio Vermelho.

governador da Bahia, Jaques Wagner, ao lado do filho do casal, João Jorge Amado, no velório de Zélia Gattai; a casa do Rio Vermelho, onde morou o casal, pode virar um museu

Paixão Barbosa

SALVADOR. Num domingo chuvoso na capital baiana, centenas de pessoas, famosas e anônimas, foram ao velório da escritora Zélia Gattai, viúva de Jorge Amado, no cemitério Jardim da Saudade de Salvador. Abatida, a filha Paloma Amado mostrava-se calma, mas inconformada com a morte da mãe. No sábado, às 16h30m, depois de 31 dias internada no Hospital da Bahia, Zélia não resistiu às complicações surgidas após uma cirurgia no intestino. A escritora tinha 91 anos.

Com o corpo coberto por flores brancas e amarelas, Zélia estava com um vestido longo, em estampa florida ¿ segundo Paloma, era o preferido de Jorge Amado, morto em 2001. O amor que uniu o casal por 56 anos, de 1945 até a morte dele, foi muito lembrando ontem.

João Jorge, filho do casal, compareceu no começo da manhã, abatido e silencioso. James Amado, irmão de Jorge Amado, também esteve na capela F do cemitério, onde ocorreu o velório, com a mulher Heloísa Ramos, filha do também escritor Graciliano Ramos.

Casa do Rio Vermelho pode se tornar museu

Muitos intelectuais, como o jornalista e escritor Antonio Olinto, prestaram homenagem a Zélia. Olinto, que representava a Academia Brasileira de Letras (ABL), da qual Jorge e Zélia foram membros, fez uma oração silenciosa junto ao caixão.

¿ Zélia escreveu de uma forma que só uma mulher consegue escrever. Criou uma coisa nova na literatura brasileira, o papel de uma memorialista ¿ afirmou Olinto, referindo-se a títulos de sucesso como ¿Anarquistas graças a Deus¿ e ¿Um chapéu para viagem¿.

O governador da Bahia, Jaques Wagner, também participou da despedida e acenou com a possibilidade de transformar a casa onde a escritora viveu com o marido, a mítica casa do Rio Vermelho, em museu:

¿ Se houver um acordo com a família, sem dúvida alguma será um ponto de visitação e de orgulho para os baianos.

O prefeito de Salvador, João Henrique, chegou ao cemitério por volta das 15h. Assim como o governo do estado, a prefeitura decretou luto oficial de três dias, a partir de hoje.

O deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), que esteve no velório com o pai, o senador Antônio Carlos Magalhães Jr., comentou a relação da escritora paulista com a Bahia:

¿ Zélia foi adotada de coração pelos baianos e adotou a Bahia também. Ela se enquadrou completamente no que havia de mais legítimo e genuíno do nosso estado.

Emocionados, os empregados da casa da escritora vestiam camiseta com a foto de Zélia e a frase ¿Mais uma estrela a brilhar no céu¿. Representantes da centenária Irmandade da Boa Morte, que reúne mulheres negras descendentes de escravos na cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, despediram-se com um ritual de cânticos, orações, velas e terços ¿ o mesmo que realizaram em 2001, no velório de Jorge Amado.

Às 17h10m, o corpo de Zélia Gattai foi levado para o salão de cerimônias do crematório, onde foram feitas novas homenagens por parentes e amigos, marcando as despedidas finais à escritora. A cremação está marcada para hoje, em horário não divulgado pela família. As cinzas serão depositadas junto às de Jorge Amado no quintal da casa do Rio Vermelho.

Na madrugada de sábado, os médicos constataram que Zélia apresentava um quadro de choque circulatório irreversível.

Da agência A Tarde

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