Título: Contagem reggressiva para Obama
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 19/05/2008, O Mundo, p. 23

Senador anuncia que lançará nova fase da campanha, já como virtual candidato democrata.

Os próprios simpatizantes de Hillary Clinton parecem já estar mais convencidos do que ela de que Barack Obama será o candidato do Partido Democrata à Casa Branca. Na tarde de sábado, apenas 350 pessoas foram ao seu comício no ginásio de esportes da Universidade Estadual de Kentucky, em Frankfort. Para evitar uma imagem desoladora na TV e nas fotos dos jornais, os organizadores, em cima da hora, retiraram as cadeiras vazias do local. No dia anterior, em Dakota do Sul, o número de repórteres era maior do que o dos eleitores que se reuniram para ouvi-la.

A própria candidata começou também a dar sinais de que percebeu que o fim de seu sonho está próximo. Ela alterou o tom de seu discurso. Embora continue insistindo em pedir votos, alegando que ainda tem chances de derrotar Obama, ela deixou de fazer críticas a ele e passou a denunciar com muita ênfase atos e idéias do candidato republicano, John McCain, e do presidente George W. Bush ¿ demonstrando um esforço mais partidário do que pessoal.

Há quem veja nisso um exercício de retirada digna, uma vez que a equipe de Obama anunciou na noite de sábado que em vez de ir às prévias eleitorais de Oregon ou Kentucky, amanhã, ele estará em Iowa para lançar de forma clara, ainda que extra-oficialmente, o início da etapa final de sua candidatura: a disputa direta com o republicano John McCain.

Possível pressão para chapa conjunta

Nos últimos dias Obama já sinalizara isso na prática, em ríspidos debates à distância tanto com McCain quanto com Bush, sem se importar com a campanha de Hillary. Ou seja: como se a sua própria indicação já tivesse sido confirmada. Em seus discursos em Oregon, por exemplo, Obama se referiu à sua disputa com a senadora ¿ e também diretamente a ela ¿ no passado:

¿ Foi uma disputa muito dura ¿ disse ele num determinado momento.

Mais adiante repetiria a dose quando, ao se referir a Hillary, afirmou:

¿ Ela foi implacável e muito eficiente.

Voltar a Iowa amanhã, no entanto, será um lance mais drástico. Aquele estado é tradicionalmente o local da primeira prévia eleitoral, e a deste ano foi vencida por ele. Será, portanto, um gesto político ainda maior, que traz em si mesmo um grande poder simbólico.

¿ A esperada vitória amanhã em Kentucky, mesmo sendo por uma grande margem, não vai ajudar Hillary em termos de indicação. Mas poderá fortalecer a sua figura. Ela poderá vir a influenciar a plataforma do partido ou definir um papel para si mesma na campanha ¿ disse Terry Madonna, especialista em Presidência da República e diretor do Centro para Política e Assuntos Públicos, da Pensilvânia.

Hillary sabe que vencerá a prévia em Kentucky com uma vantagem de 30 pontos. Mas também sabe que perderá a de Oregon, também amanhã, por uma margem elástica.

¿ Ela terá em Kentucky uma vitória tão arrasadora quanto a da semana passada (por 41 pontos) na Virgínia Ocidental. E daí? Isso não vai alterar nada. Na prática, Obama é que se aproximará ainda mais da indicação ¿ disse Morris Reid, estrategista do Partido Democrata, acrescentando que essas duas primárias farão Obama ultrapassar a metade do total de delegados, ficando faltando somente cerca de 80 para atingir o índice necessário (2.025) para a vitória.

Diante dessa situação, surgiram no fim de semana novas pressões internas no Partido Democrata para que seja formado o já chamado Dream Team, a equipe (no caso, a dupla) dos sonhos para a eleição, com uma chapa Obama-Hillary.

¿ Não existe química pessoal entre os dois. Mas não se pode descartar inteiramente tal possibilidade. É bem capaz que haja uma insistência nesse sentido ¿ disse Larry Sabato, analista político da Universidade de Virgínia.

Seja como for, os principais arrecadadores de contribuições da equipe de Hillary e os da de Obama já começaram a conversar sobre a fusão de ambas, para estabelecer uma estratégia para a campanha da eleição geral em novembro. Pelo menos três reuniões aconteceram entre eles nos últimos dez dias ¿ em Nova York, Boston e Washington.

¿ Já estamos todos pensando em novembro e começamos o diálogo. Eu deixei claro ao pessoal do Obama que todos são bem-vindos a bordo, e eles disseram o mesmo a nós ¿ contou Robert Zimmerman, um dos principais arrecadadores para Hillary.