Título: CPMF: Lula recua e deixa tarefa para aliados
Autor: Cotta, Sueli ; Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 20/05/2008, O País, p. 10

Durante reunião no Planalto, prevalece idéia de que seria erro governo assumir iniciativa de recriar imposto

Cristiane Jungblut e Luiza Damé

BRASÍLIA e BELO HORIZONTE. Diante da previsível reação negativa da sociedade e do empresariado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem aos ministros que nem ele nem o governo vão assumir a autoria da proposta de recriação da CPMF para financiar a Saúde - com alíquota de 0,05% a 0,08%. Mas repassou a missão aos seus aliados no Congresso. A estratégia do Palácio do Planalto, decidida na reunião de coordenação política de ontem, é preservar Lula do desgaste político de propor uma medida impopular e do risco de repetir uma derrota como a que sofreu em dezembro, quando o Senado acabou com a CPMF.

"Que novidade é essa?", quis saber Lula na reunião

Horas depois da reunião do Planalto, dois petistas - os líderes do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), e do PT na Câmara, Maurício Rands (PE) - disseram que o partido está disposto a arcar com o ônus político de patrocinar a recriação da CPMF. Essa é uma das idéias em estudo para estabelecer novas fontes de financiamento da Saúde, previsto na regulamentação da chamada Emenda 29, que deve ser votada dia 28 na Câmara. Pela emenda, os gastos do governo com o setor têm que aumentar em mais de R$8 bilhões por ano.

O presidente Lula abriu a reunião da coordenação mostrando irritação com declarações de que o governo está defendendo a criação de um novo imposto.

- Que novidade é essa? Foi o Congresso que aprovou a Emenda 29 e cabe a ele encontrar a fonte de financiamento - disse Lula, segundo relato dos presentes, reafirmando que vai vetar a regulamentação da Emenda 29 se ela for aprovada sem apontar uma fonte de custeio.

Coube ao ministro das Relações Institucionais, José Múcio, dar o recado:

- Discutimos a Emenda 29. E no fim, por absoluta unanimidade, e com a palavra final do presidente, o governo achou que era melhor a Casa (Câmara) apresentar uma solução. A CPMF foi discutida e não será recriada - disse Múcio. - O governo não vai interferir. Em dezembro, o governo mobilizou aliados (para votar a CPMF) e não tivemos sucesso. Não queremos entrar em queda-de-braço com a Casa. Ninguém esqueceu aquilo (a derrota em dezembro).

O recado deu resultado e o PT saiu em campo.

- Temos que aprovar a Emenda 29 de forma responsável. A decisão é do Parlamento, mas eu estou disposto a apresentar uma proposta criando um imposto para a saúde. Quero conversar com a base e a oposição, porque esse é um assunto entre oposição e governo - disse o líder do governo, Henrique Fontana.

Na mesma linha, o deputado Mauricio Rands, líder da bancada petista, falou de um estudo que está sendo feito para recriar a CPMF e citou a possibilidade de destinar parte dos recursos de impostos de bebidas e cigarros para a área:

- O PT está pronto a apresentar ao Congresso uma fórmula que identifique as receitas.

O líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), disse que apóia uma nova CPMF, mas com algumas garantias:

- Amanhã (hoje), vou apresentar a Mantega duas preliminares: de que 100% dos recursos sejam para a Saúde e que se saiba, no papel, para quais programas e estados vai o dinheiro. Isso é importante para convencer a todos.

Já o coordenador da Frente Parlamentar de Saúde, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), disse ser contra a proposta:

- O governo quer a criação de um novo imposto e não quer assumir a idéia.

Durante a reunião de coordenação, prevaleceu a avaliação da área de comunicação de que seria um erro assumir a paternidade da proposta. O ministro da Fazenda, Guido Mantega - acusado de ter sido inábil em dezembro nas negociações - assegurou que o dinheiro do excesso de arrecadação (R$18 bilhões apenas nos três primeiros meses do ano) não pode ser usado para a saúde.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, afirmou ontem, num evento no BNDES, que o governo estuda aumentar os impostos em bebidas e cigarros para elevar os investimentos na saúde.

- O presidente Lula analisa fontes de mais R$24 bilhões para a pasta da saúde. Há algumas hipóteses em estudo. Mas, de qualquer forma, mesmo se aumentar o imposto de cigarro e bebidas será insuficiente para a saúde. Faz sentido obter mais recursos para a saúde provenientes desses setores, que acarretam doenças. Mas estou interessado nos recursos para a minha pasta, e não nas fontes.

Já o governador de Minas, Aécio Neves, disse que dificilmente deputados e senadores vão trabalhar para aprovar um novo imposto em ano eleitoral.

- Acho que, neste momento, o ideal é o governo racionalizar os seus custos para que nós possamos ter um financiamento mais adequado para a saúde. O governo vem gastando muito e, a meu ver, mal.

COLABORARAM Sueli Cotta e Bruno Rosa