Título: Salário de R$10 mil não atrai médicos
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 25/05/2008, O País, p. 11

Agentes de saúde de operação da Funasa usavam repelente.

ALDEIA MARONAL, VALE DO JAVARI (AM). O chefe do Serviço de Assistência da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Atalaia do Norte, o índio Beto Marubo, diz que o abandono dos indígenas na região se transformou num caso de polícia:

- A política indígena está uma salada, não há foco. O Vale do Javari é problema de polícia. Tem que investigar, chamar a CGU (Controladoria Geral da União). Gastam errado, os recursos não vão para a saúde - disse Marubo, que é chefe do Serviço de Assistência da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Atalaia do Norte e atuou como intérprete na aldeia Maronal.

Temendo contrair malária, o diretor de Saúde Indígena da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Wanderley Guenka, e os demais profissionais de saúde aplicavam repelente contra mosquitos o tempo todo. Ele reclamou da burocracia, inclusive das exigências de licitação que emperram até a compra de computadores e a instalação de internet nas comunidades indígenas - o que ajudaria a comunicação das equipes de saúde.

Ao visitar três aldeias dos índios marubos, entre 15 e 19 de maio, Guenka ouviu muitas críticas à atuação da Funasa:

- É difícil responder pelas coisas do passado. Quero responder pelos dez meses em que estou no departamento.

"Para erradicar a malária, só se acabar com a floresta"

Com investimento de R$3 milhões, a operação enfrenta problemas de todo tipo. O helicóptero do Exército que levaria os agentes de saúde à aldeia Maronal pifou e teve de ser substituído, atrasando a chegada da equipe em dois dias. O mesmo tinha ocorrido em Massapê. Na véspera da partida de Cruzeiro do Sul (AC) para Maronal, seis agentes permaneciam em Tabatinga (AM), a 700 quilômetros. A agência de viagens da Funasa, que funciona no Espírito Santo, não comprara as passagens aéreas. O diretor exasperou-se. A solução foi fretar um avião, segundo Guenka, pelo mesmo preço das passagens.

Guenka considera um sonho conseguir médicos para atuar no Vale do Javari. O salário oferecido é de R$10 mil, mas não atrai interessados. O diretor defende que médicos formados em universidades federais sejam obrigados a trabalhar em áreas indígenas, como contrapartida pelo curso gratuito. Também médicos que prestam serviço obrigatório para as Forças Armadas, segundo ele, deveriam atuar no Vale do Javari.

O presidente da Funasa, Francisco Danilo Forte, disse que o orçamento da fundação este ano é de R$4,5 bilhões, dos quais R$280 milhões para a saúde indígena. Segundo Forte, a malária e a hepatite são doenças endêmicas na Amazônia:

- Na área de floresta não tem como erradicar a malária, mas aprender a conviver com ela. (Erradicar), só se acabar com a floresta.