Título: Subsídio destrói os produtores de países pobres
Autor: Magalhães-Ruether, Graça
Fonte: O Globo, 25/05/2008, Economia, p. 30
BERLIM. O novo relator da ONU para o Direito à Alimentação, Olivier de Schutter, afirma que os programas de incentivos aos biocombustíveis têm um peso importante, equivalente a cerca de 30%, na explosão dos preços dos alimentos. O belga, que assumiu o cargo há três semanas, diz que os biocombustíveis não são uma solução para o meio ambiente a longo prazo.
A reforma sugerida pela União Européia (UE) ajudará no aumento da produção de alimentos em países em desenvolvimento?
OLIVIER DE SCHUTTER: Espero que a proposta tenha um efeito positivo nas discussões das próximas semanas na rodada de negociação de desenvolvimento de Doha. A redução não é bastante, mas a UE não é a única que pode ser criticada pelos subsídios. Países como Japão, Coréia do Sul e EUA, juntos, gastam US$324 bilhões por ano em subsídios agrícolas. Isso destrói as chances dos produtores dos países em desenvolvimento. Uma redução (dos subsídios) aumentaria as chances dos produtores dos países em desenvolvimento.
A crise dos alimentos é passageira?
SCHUTTER: Eu diria que é de médio prazo e que foi causada por diversos fatores. Problemas nos principais países produtores, especulação, mas também produção crescente de biocombustíveis.
O Conselho de Direitos Humanos da ONU se reuniu semana passada para discutir a crise. Quais foram as principais conclusões?
SCHUTTER: A principal foi a necessidade de uma ação mundial para facilitar o acesso dos países pobres aos alimentos. Foi criticado também o aumento da produção de biocombustíveis. Eu propus um congelamento dos novos investimentos (em programas de biocombustíveis) e que a UE cancelasse a meta de adição de 10% do etanol à gasolina até 2020.
Seu antecessor no cargo, Jean Ziegler, disse que a crise atual é um genocídio moderno. O senhor concorda com ele?
SCHUTTER: Trata-se de um exagero. Mas o que ele queria dizer é que a crise tem efeitos dramáticos para os países do Terceiro Mundo. Devemos admitir que é uma crise global, que só pode ser resolvida com um esforço global.
Os biocombustíveis são a causa principal da explosão dos preços dos alimentos?
SCHUTTER: São uma das causas mais importantes. Calculo que 30% do aumento dos preços dos alimentos são devido aos biocombustíveis. É um fator muito significativo.
Por que o senhor critica o programa de biocombustíveis brasileiro?
SCHUTTER: Não critico o programa porque é importante, traz empregos. Defendo um congelamento dos investimentos, mas isso não é a abolição do projeto.
A contribuição do etanol para a redução do efeito estufa não é importante?
SCHUTTER: O efeito ecológico não é positivo. Para a produção de agrocombustível, como prefiro chamar, é necessária uma grande quantidade de energia, o que reduz seu efeito positivo. Além disso, as florestas são destruídas. Hoje o Brasil destrói a Floresta Amazônica. (Graça Magalhães-Ruether)