Título: Direito de todos
Autor: Santini, Luiz Antonio
Fonte: O Globo, 26/05/2008, Opiião, p. 7

Proteger as gerações presentes e futuras das devastadoras conseqüências sanitárias, sociais, ambientais e econômicas geradas pelo consumo e pela exposição à fumaça do tabaco. Este é o objetivo do tratado internacional de saúde pública articulado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, da qual o Brasil é um dos 168 signatários. Tal mobilização mundial se explica pelas alarmantes conseqüências do tabagismo para a saúde da população.

As mortes por doenças causadas pelo uso do tabaco somam 4,9 milhões por ano em todo o mundo. Entre os não-fumantes também é crescente o número de vítimas: a fumaça que sai da ponta do cigarro aceso causa doenças graves, como câncer de pulmão, doenças cardiovasculares e doenças respiratórias agudas e crônicas, que atingem as crianças mais intensamente. O tabagismo passivo em ambientes de trabalho tem status de risco ocupacional.

Para a OMS, a única estratégia eficaz são os ambientes 100% livres da fumaça. Não existe sistema de ventilação capaz de manter ambientes fechados livres das concentrações dos elementos químicos cancerígenos da fumaça do cigarro.

Os argumentos contrários, que sustentam a hipótese de queda na arrecadação, não condizem com a realidade. Desde 2002, é proibido fumar em ambientes públicos e de trabalho em El Paso, Texas, Estados Unidos. Quem desrespeita a lei, pode ser punido com multa de até 500 dólares. A análise da evolução da receita dos bares e restaurantes da cidade no período de 12 anos anteriores e no ano seguinte à proibição, feita a partir de notas fiscais, não mostrou mudança significativa. Em 2004, cinco estados e 72 municípios norte-americanos já tinham adotado leis que proíbem fumar em locais fechados.

Vários estudos com previsões alarmistas sobre perda de receita e fechamento de postos de emprego no setor hoteleiro foram financiados pela indústria do tabaco. Pesquisa da Universidade da Califórnia publicada no "Journal Tobacco Control" em 2003 levantou as fontes de financiamento de 97 desses estudos e as bases de dados utilizadas. A pesquisa mostrou a fragilidade das fontes, que se utilizaram de interpretações subjetivas.

O Brasil já adotou muitas das recomendações da Convenção: proibição de publicidade, restrição de patrocínio de eventos esportivos pela indústria do tabaco e desenvolvimento de programas de educação e conscientização sobre os males do tabagismo. A mudança na legislação proposta pelo Ministério da Saúde para proibir o uso do tabaco em ambientes coletivos fechados é um passo determinante na defesa da saúde dos cidadãos, em especial a dos trabalhadores e aos não-fumantes, expostos involuntariamente aos malefícios da fumaça tabagística ambiental.

LUIZ ANTONIO SANTINI é diretor-geral do Instituto Nacional de Câncer (Inca).