Título: Desafio da Unasul será reduzir tensão no continente
Autor: Oliveira, Eliane; Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 23/05/2008, O País, p. 9

Novo organismo, a ser criado hoje, sofre resistências

BRASÍLIA. Disposto a fazer um apelo pela integração regional, paralisada por conta dos conflitos envolvendo Venezuela, Colômbia e Equador, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva será o anfitrião, hoje, de um encontro com os chefes de Estado da América do Sul para a assinatura do tratado criando a União Sul-Americana de Nações (Unasul). O Brasil quer fazer da Unasul uma instância para permitir a resolução das pendências e reduzir o clima de tensão na região, marcado por ataques verbais e até incursões territoriais nos países andinos. Mas o organismo já nasce com problemas. Indicado para ser o secretário-geral, o ex-presidente equatoriano Rodrigo Borja renunciou ao posto.

Borja argumentou que há uma resistência de alguns países em dar "eficácia" à atuação da Uniasul.

- Os presidentes em sua maioria inclinam-se pela formação de algo que mais se parece com um fórum do que com uma instituição orgânica. E isso realmente não me convence - disse Borja, sem dar maiores detalhes sobre quais países rejeitaram os planos de reforçar a atuação da Unasul.

Antes de saber da renúncia do equatoriano, fontes ligadas ao Palácio do Planalto disseram que o presidente reforçará o discurso pela paz na região. Lula também pretende destacar a importância do Conselho de Defesa e a necessidade de integração física, econômica e política na América do Sul.

Chávez falará contra violação de território

Lula dirá que a América do Sul é uma zona de paz e onde reina a democracia. O que as pessoas vêem como divergências, dirá o presidente, ele vê como dinamismo político entre as nações. Defenderá acordos comerciais na região "justos e equilibrados" e destacará a importância de ser consolidada o mais breve possível a integração energética.

Um discurso mais agressivo é esperado do presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Pessoas ligadas a Chávez revelaram que ele pretende defender a inviolabilidade territorial que, a seu ver, foi fortemente desrespeitada em dois momentos pela Colômbia: no Equador, quando tropas colombianas mataram dezenas de guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), incluindo o segundo homem do grupo, Raúl Reyes; e na semana passada, quando soldados colombianos teriam invadido o território venezuelano. Hoje pela manhã, Lula terá encontro com Chávez e os presidentes da Bolívia, Evo Morales, e do Equador, Rafael Correa.

Embora alguns especialistas afirmem que a Unasul será mais uma sigla na região, o evento será uma oportunidade para os presidentes conversarem sobre temas que não puderam tratar na semana passada, quando estiveram reunidos com europeus e caribenhos, em Lima, no Peru. Segundo fontes da área diplomática, haverá um momento em que todos estarão sozinhos em uma sala e poderão colocar as agendas em dia. Não se descarta momentos constrangedores entre os inimigos políticos Chávez e Rafael Correa, de um lado, e Álvaro Uribe, da Colômbia, de outro.

- Considero positivo que se tome uma iniciativa como essa, num momento em que quase houve um choque entre Colômbia e Equador - afirmou Rubens Ricupero, professor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).

Para ele, que ocupou, até 2004, o cargo de secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), é difícil esperar que a criação da Unasul faça alguma diferença, a curto prazo, num momento de mais divergências do que convergências na América do Sul.

*Com agências internacionais