Título: Dinheiro para poucos
Autor: Rocha, Carla; Amora, Dimmi
Fonte: O Globo, 23/05/2008, Rio, p. 18

No fim de 2006, Rosinha pagou 49% de R$445 milhões a 20 empresas

Pesquisa realizada nos pagamentos das 18 maiores secretarias e empresas do governo mostrou que, nos últimos três dias úteis do ano de 2006, quando terminava a gestão de Rosinha Garotinho, foram feitos pagamentos de serviços e obras num total de R$445 milhões. O valor corresponde a 6% dos R$7,5 bilhões gastos naquele ano com este tipo de despesa. Ao se passar o pente fino nesses pagamentos, constata-se que 49% do dinheiro ficaram com apenas 20 dos mais de três mil fornecedores do estado que aguardavam na fila para receber. Entre os escolhidos, alguns chegaram a levar 100% do que lhes era devido. Mas a maioria amargou um calote.

Entre as empresas que se beneficiaram dos pagamentos está a Delta Engenharia, empresa que mais recebeu recursos ao longo dos governos de Rosinha e Anthony Garotinho. Foram R$25 milhões pagos por Cedae, DER e Secretaria de Transportes. Desse total, R$6,2 milhões foram pagos a ela num consórcio com a empresa Banenge. Só em 2006, a construtora recebeu mais de R$120 milhões do estado.

Duas ONGs receberam R$27 milhões

Outro grupo que teve sorte foi o de empresas de Arthur Cesar de Menezes Soares Filho e seu irmão, Luiz Roberto. As empresas deles ¿ Vigo Central de Serviços, Cor e Sabor, Bem Nutritiva, Service Clean, Tiger Segurança e Shadow Participações ¿, que tinham contratos com diversos órgãos do estado, receberam R$21 milhões em três dias. A Vigo, que presta serviços de limpeza, recebeu R$9 milhões. Arthur já foi chamado de ¿Novo Rei das Quentinhas¿, em alusão ao falecido empresário Jair Coelho, que durante 20 anos monopolizou o fornecimento de refeições para o sistema penitenciário estadual.

Com contratos sob suspeita sendo investigados pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e pelo Ministério Público, duas ONGs também receberam. A Fundação Pró-Cefet levou R$14,6 milhões nos três últimos dias de 2006. A entidade era responsável pelo pagamento de cooperativas que contratavam profissionais de saúde para unidades hospitalares. A nova gestão cancelou o contrato com a Pró-Cefet e paga hoje quase metade do valor pelo mesmo serviço.

A outra ONG é a Associação Educacional São Paulo (AESP), que pertence ao ex-deputado federal Paulo Lima (PMDB-SP), que apoiava a pré-candidatura de Anthony Garotinho à presidência em 2006. A instituição recebeu R$13 milhões nestes três dias. Este pagamento praticamente quitou um contrato de R$33 milhões da ONG com a Secretaria de Educação para o fornecimento de apostilas para alunos do ensino médio. O TCE achou várias irregularidades no contrato, entre elas o não cumprimento de parte do que estava previsto.

O Fundo Estadual de Saúde (FES), vinculado à Secretaria estadual de Saúde (SES), foi o órgão que mais desembolsou recursos nestes três dias analisados. Foram R$142 milhões para pagamentos de serviços e obras. Enquanto a maioria das empresas que forneceu a hospitais públicos e à SES ficou com dívidas, a Sunmedcare Comércio de Produtos Hospitalares conseguiu um feito: recebeu tudo o que a secretaria lhe devia de uma vez. O valor do pagamento foi de R$10,1 milhões pelo fornecimento de reagentes para exames.

A Cedae pagou, no total, R$64 milhões nestes três dias. O consórcio CBPO/Via/Carioca/Brochier/ECL ficou com R$13,2 milhões, o que corresponde à metade dos R$26,4 milhões recebidos ao longo de todo o ano de 2006 pelo grupo. Juntando outros R$15,5 milhões que recebeu da Empresa de Obras Públicas (Emop) e da Rio Trilhos (pela execução do Metrô), a CBPO Engenharia é a empresa que mais recebeu recursos neste período. Naquele ano, a CBPO embolsou mais de R$180 milhões do governo.

O consórcio formado pelas empresas CNO/AG/OAS/Engevix foi o grupo que mais recebeu recursos de uma única fonte: R$21,9 milhões da Emop para o pagamento das obras do Complexo do Maracanã para o Pan-Americano, o que correspondeu a 22% de tudo que lhe foi pago em 2006. A Cedae pagou ainda R$9 milhões para o Consórcio Passareli/Construbase nestes três dias. O valor representa 46% de tudo o que o grupo recebeu do governo naquele ano. Ainda foi autorizado o pagamento de outros R$6 milhões, que foi cancelado.

Já o Departamento de Estradas de Rodagem (DER), que pagou R$50,2 milhões em três dias, concentrou quase 30% deste valor para quitar dívida com a empresa Ipê Engenharia. Sozinha, a empreiteira levou R$13,6 milhões. O valor corresponde a 34,3% de tudo o que a companhia recebeu ao longo do ano. O ex-secretário de Comunicação do governo Rosinha Garotinho, Ricardo Bruno, disse que os responsáveis por cada área que fez os pagamentos é que deveriam dar as explicações, mas eles não foram encontrados.