Título: Velho Oeste
Autor:
Fonte: O Globo, 27/05/2008, Opinião, p. 6

Écompreensível que o presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, ao acabar com 61 anos de domínio do Partido Colorado no país, anuncie planos para a melhoria de vida de seus concidadãos. Mas precisa ser muito cauteloso sobre temas explosivos, até porque só tomará posse a 15 de agosto.

Um desses temas é a reforma agrária, promessa de campanha. No feriado de Corpus Christi, Lugo disse que é chegado ¿o momento de buscar uma reforma agrária possível, ser realista e ver que é possível no Paraguai uma reforma agrária sem traumas, sem violência, que se faça de modo racional, de maneira serena¿.

Não é o que se vê no campo. O primeiro alvo de ataques armados e invasões de terra foram os chamados brasiguaios, fazendeiros brasileiros que cultivam terras no Paraguai e são responsáveis por cerca de 80% dos grãos exportados pelo país. O discurso do ex-bispo Lugo, misturando elementos da Teologia da Libertação com o bolivarianismo, encontrou ressonância nos movimentos organizados de sem-terra do Paraguai. Várias propriedades de brasiguaios foram invadidas e os donos ameaçados e até mantidos como reféns pelos camponeses. Acampados nos arredores de outras fazendas, o movimento anunciou pelo menos mais 20 ocupações até o dia 15 de agosto, quando Lugo assume.

O atual presidente, Nicanor Duarte, aplicou uma lei já existente criando a denominada fronteira interna ¿ uma faixa de 50 quilômetros de distância da fronteira real, na qual é proibida a estrangeiros a posse irregular de terras. Tudo isso tornou a situação explosiva no campo. Os sem-terra estão armados. Os fazendeiros também se armam ou contratam milícias. Brasiguaios tratam de equipar a polícia local para serem protegidos.

O Brasil precisa estar pronto para agir diante de uma situação que pode fugir ao controle das autoridades paraguaias, não só para proteger seus cidadãos que produzem no país vizinho como para manter a segurança na fronteira. O Paraguai tem o direito de escolher que modelo fundiário deseja, mas não deve apenas debatê-lo em gabinetes, fingindo não ver que o interior do país vive uma situação típica do Velho Oeste, na qual predomina a lei do mais forte e mais armado.