Título: Parlamentares, sem toga, têm dia de juiz
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Fonte: O Globo, 31/05/2008, Rio, p. 14

Nos corredores da Alerj, deputados discutiam argumentos jurídicos para livrar o colega

Até a sessão em plenário que aprovou o decreto legislativo revogando a prisão do deputado Álvaro Lins (PMDB), parlamentares da Assembléia Legislativa do Rio apresentaram inúmeros argumentos para defender a liberdade do colega. Embora as discussões na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) só tenham começado após o procurador da Casa, Marcelo Cerqueira, apresentar o seu parecer sobre o caso, nos corredores já era dado como certo que Lins não permaneceria preso nem mais um dia.

Os parlamentares estavam convictos de que a decretação da prisão do deputado tinha sido arbitrária, mas faltava o amparo jurídico para defender a tese. Com o parecer do advogado Marcelo Cerqueira, que afirmou que a prisão foi ilegal porque a Constituição Federal não prevê entre os crimes inafiançáveis a lavagem de dinheiro, mas somente tortura, tráfico e terrorismo. Iniciou-se uma intensa discussão, pois Álvaro Lins foi detido em flagrante sob a acusação de lavagem de dinheiro.

Já na CCJ, enquanto os integrantes da comissão - os deputados Domingos Brazão (PMDB), Paulo Melo (PMDB), Átila Nunes (DEM), Délio Leal (PMDB) e Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB) - concordavam com a avaliação da procuradoria, chegando a fazer elogios aos argumentos do procurador, o deputado Gilberto Palmares (PT) lembrou que havia outras interpretações para o caso. O deputado disse que o crime de lavagem de dinheiro era, sim, inafiançável. E, portanto, poderia ter sido usado pela Polícia Federal para fundamentar a prisão de Álvaro Lins. Lavagem de dinheiro é crime inafiançável, conforme a lei 9.613/98.

Com a observação de Palmares, os deputados ficaram confusos. Alguns recorreram à Constituição e ao Código Penal, e continuaram insistindo na tese de que a prisão fora arbitrária, mas naquele momento já não faziam menção ao parecer da Procuradoria.

- Voto com minhas convicções, e não no parecer da Procuradoria - disse Paulo Melo, minutos antes de iniciar a votação do projeto de decreto legislativo.

Encerrada a discussão, a CCJ iniciou a votação do projeto de decreto legislativo determinando a revogação da prisão. Segundo o documento, a revogação foi necessária porque o deputado não oferece risco para o andamento do processo, tem endereço fixo e também porque "não existe nenhuma condenação ou antecedentes criminais" contra o deputado.

A discussão era importante porque a CCJ poderia também decidir não se manifestar sobre a prisão de Álvaro Lins, caso ficasse entendido que estava legalmente amparada.

- O parecer da Procuradoria levou em conta apenas a leitura da Constituição para defender que houve abuso de poder na prisão. Na minha avaliação, a Casa não poderia entrar em análise jurídica. A decisão na Casa é política. Quem tem que avaliar questões jurídicas é a Justiça, que com certeza levaria em conta a lei 9.613 - explicou o advogado Luiz Paulo Viveiros de Castro, que foi para Alerj auxiliar os deputados da bancada do PT.

Para o deputado Alessandro Molon (PT), a Alerj poderia ter evitado o desgaste de ter que votar a revogação da prisão.

- A Alerj não poderia entrar nesse tema. Era melhor ter deixado isso para o Judiciário, que é o lugar apropriado. Os advogados do deputado é que deveriam ter procurado a Justiça para libertar o parlamentar - afirmou.