Título: Governo doura a pílula da CSS
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 29/05/2008, O País, p. 3

IMPOSTO DO CHEQUE VOLTA À CENA

Proposta de aumentar isenção de novo tributo não diminui resistência e votação é adiada

Cristiane Jungblut

Para tentar tornar mais palatável à sociedade a recriação da CPMF, batizada agora de Contribuição Social para a Saúde (CSS), a base governista aumentou para R$3.038 o limite de isenção do pagamento do novo tributo - o mesmo valor do teto das aposentadorias pagas pelo INSS. A estratégia, no entanto, não melhorou o clima na Câmara. Diante da obstrução ferrenha da oposição, com a pauta trancada por uma medida provisória, o líder do PT, Maurício Rands, propôs o adiamento da votação da Emenda 29 para a próxima terça-feira. Alguns aliados afirmaram que havia garantidos apenas 275 votos, margem considerada pequena, diante dos 257 votos necessários.

- Preferimos não fazer uma votação açodada. É preciso dar mais informação à sociedade. O debate avançou hoje, mas pode avançar mais - justificou o líder do PT, Maurício Rands, considerando normais as prometidas dissidências na base.

A oposição comemorou:

- Eles estão sem votos - disse Paulo Bornhausen (DEM-SC).

Pela proposta dos governistas apresentada para votação na Câmara, ontem à noite - dentro da regulamentação da Emenda 29 -, a CSS terá uma alíquota de 0,1% e só passará a ser cobrada em janeiro de 2009, quando deverá arrecadar cerca de R$10 bilhões. Para 2010, estima-se R$12,9 bilhões e, em 2011, mais R$14 bilhões.

O aumento do teto de isenção foi uma das medidas adotadas para driblar resistências dentro da própria base, em especial no PR e no PMDB. A idéia inicial era manter a isenção para pessoas com renda de até três salários mínimos, como era no caso da CPMF, cuja alíquota era de 0,38%. O deputado Pepe Vargas (PT-RS), da Frente Parlamentar da Saúde e escolhido a dedo para ser o relator da projeto, apresentou um substitutivo totalmente diferente do projeto aprovado no Senado - que aumentava o orçamento da saúde, mas não apontava fonte de receita.

Temporão faz corpo-a-corpo por proposta

Além de ressuscitar a CPMF, os governistas mantiveram o atual cálculo para o orçamento federal da saúde - corrigido pela variação do PIB nominal (considerando a inflação). Com a manobra, o governo não será obrigado a destinar 10% da receita bruta para a saúde, como previa o texto do Senado. Pelo modelo atual, que o governo quer manter, esse percentual fica em torno de 7%, ou R$48 bilhões em 2008.

- Toda a base vai votar junta e toda a base vai junta ao governo pedir que, para este ano, dê mais R$6 bilhões ao Ministério da Saúde, já que a CSS só começará a ser cobrada em 2009. O importante é que a isenção beneficiará 80 milhões de pessoas, entre trabalhadores e aposentados que ganham até R$3.038, teto das aposentadorias pagas pela Previdência - disse Rands, autor da proposta de recriar a CPMF por lei complementar e não por emenda constitucional, antes de decidir pelo adiamento da votação.

O governo liberou o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, para fazer corpo-a-corpo em favor da proposta. Ele se reuniu com o coordenador da Frente Nacional da Saúde, Darcísio Perondi (PMDB-RS), que era contra a recriação da CPMF, mas poderia mudar de idéia à noite.

A oposição reiterou a ameaça de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) e acusou o governo de querer criar um novo imposto usando a saúde como desculpa. Para provocar os governistas, deputados de DEM e PSDB levaram ao plenário cofrinhos cheios de moedas, ironizando o "cofrinho" do Fundo Soberano (poupança pública anunciada pelo governo).

- O governo quer ressuscitar a CPMF. Mais do que dinheiro, o governo quer é se recuperar da dor-de-cotovelo da derrota no Senado (que derrubou a CPMF) - afirmou o deputado Rafael Guerra (PSDB-PE), da Frente Nacional da Saúde.

Antes do adiamento, DEM, PSDB, PPS e PSOL também disseram que votariam contra. Todos reclamaram que o texto do projeto ainda não havia aparecido em Plenário.

Para ser ter uma idéia da economia que será feita ao se manter o atual cálculo de reajustar o orçamento da saúde pela variação do PIB, o governo terá que investir, em 2011, R$79,3 bilhões na saúde, já contando com a arrecadação da CSS. Se fosse aplicado o critério de destinar 10% da receita bruta, o orçamento da saúde, em 2011, seria de R$88,3 bilhões, segundo dados do próprio governo.

O governo manobrou para não vincular a receita da CSS ao orçamento da saúde. O projeto prevê que a contribuição será um bônus para o setor de saúde, não entrando, assim, no cálculo do piso nacional, a cada ano. Mas, diferentemente da CPMF, a CSS terá 100% de seus recursos destinados à saúde. A extinta CPMF só destinava 42% dos recursos arrecadados para a área. Ainda era descontado o percentual que ia para o caixa do governo, por meio da chamada DRU (Desvinculação de Receitas da União).