Título: Governo dará crédito para armazéns e mais dinheiro para apoio técnico
Autor: Rodrigues, Luciana; Lins, Letícia
Fonte: O Globo, 01/06/2008, Economia, p. 34

AMEAÇA GLOBAL: Ministério busca parceria para reduzir custo de máquinas

Medidas para agricultura familiar miram conter alta de preços de alimentos

RIO, SÃO JOÃO (PE) e IPÊ (RS). Preocupado em garantir o abastecimento e evitar altas adicionais nos preços dos alimentos - a inflação baixa tem sido uma âncora para a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva -, o governo vai lançar, nos próximos 30 dias, uma série de medidas para apoiar os pequenos agricultores. Segundo o secretário de Agricultura Familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Adoniram Sanches Peraci, está prevista a criação de uma linha de crédito específica para a construção de armazéns comunitários. Os recursos sairão dos R$13 bilhões previstos para o Pronaf na safra 2008/2009, com taxas de juros entre 1% e 3% ao ano.

O ministério também quer fazer uma parceria com a Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) para incentivar licitações e reduzir os preços do maquinário. Os agricultores terão um crédito específico para esse fim. E as prestações serão indexadas às cotações agrícolas - ou seja, se o valor do crédito equivale a um determinado número de sacas de milho, esse empréstimo será pago no futuro pela mesma quantidade de sacas de milho, com o governo equiparando os preços em caso de queda.

Mais R$200 milhões para empresas estaduais

O governo também quer aumentar os recursos destinados às empresas estaduais de assistência técnica rural, as Ematers - uma queixa freqüente dos agricultores é que essas instituições foram desmanteladas. A idéia é direcionar R$200 milhões. Segundo o secretário, as medidas visam a atuar nas principais barreiras à agricultura familiar: falta de estoque e baixa produtividade.

- O agricultor que está sozinho no mundo é explorado. Ao oferecer crédito para armazéns comunitários, queremos incentivar as cooperativas. Os preços vão se manter elevados nos próximos anos, é uma bela oportunidade - prevê Peraci.

Entre os agricultores gaúchos, o cooperativismo é a regra. No município de Ipê (RS), os irmãos Ivanir e Ilarino Bortolloto cuidam de uma propriedade de 43 hectares. Mantêm 12 cabeças de gado, que produzem 80 litros de leite por dia, criam porcos e aves e plantam milho, frutas e verduras. Por estar ligado a uma cooperativa, Ivanir não reclama de falta de assistência técnica.

- Sozinho, o agricultor não vai adiante - diz Bortolloto.

Leite subiu 117% no mundo e 45% no Brasil desde 2002

O crédito também faz toda a diferença. Com um sítio de apenas 7,5 hectares em São João (PE), Jerônimo José da Silva não se queixa. Planta feijão, mandioca (para o gado) e "um milhinho para a galinha". Consegue viver do seu sítio e não está devendo ao banco, no que se beneficiou do Pronaf:

- Estou em dia com as contas. Direito tem quem direito anda. A vida no campo melhorou 100%. Foi um milagre.

Mas a maior oferta de crédito e a alta dos preços de alimentos vieram acompanhadas, em alguns casos, de pressão de custos. Urdete Brustolin Mussato, que produz leite em Ipê, reclama:

- Hoje, o preço justo deveria estar em R$0,70 o litro. A gente vende por R$0,52. Os preços dos insumos, farelos de soja e de milho, vivem subindo.

Mais de metade do leite produzido no Brasil (56%) vem de pequenos agricultores. Renato Maluf, presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), lembra que o leite é um exemplo típico de como a agricultura familiar pode aliviar a alta de preços para o consumidor. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os preços internacionais do leite em pó, este ano, ficarão 117% acima da média registrada entre 2002 e 2007. No Brasil, depois de subir 45% nos últimos cinco anos, o preço do leite em pó caiu 1,03% este ano.

Peraci destaca que, no setor de leite, há grande espaço para aumentar a produtividade da agricultura familiar. Hoje, uma vaca no Brasil produz em média 3,5 litros de leite por dia - nos EUA, são 18.