Título: Atrasados para verdadeira disputa
Autor: Herbert, Bob
Fonte: O Globo, 04/06/2008, O Mundo, p. 26

Os democratas podem estar finalmente pondo um fim ao fogo cruzado que já os tomou muito tempo. E há tantas coisas que eles precisam fazer para que tenham alguma chance de conquistar a Casa Branca em novembro. E estão terrivelmente atrasados para começar a fazer.

Só agora é que o partido começa a reunir-se em volta do senador Barack Obama, que foi o provável indicado por um tempo longo demais. E ninguém sabe ao certo quanto tempo os democratas levarão para superar esse conflito desnecessariamente amargo promovido por Bill e Hillary Clinton.

Lembro do comentário de Bill Clinton, dizendo que ¿seria uma grande coisa se estivessem concorrendo na eleição presidencial duas pessoas que amem este país e que são inteiramente devotas aos interesses nacionais¿.

Ele estava falando de Hillary Clinton e John McCain. O comentário do ex-presidente reforçou as criticas dos opositores de Barack Obama, que retratam o senador como uma espécie de alienígena, nada patriótico, não inteiramente americano, demasiado estranho para ter o governo em suas mãos.

E o esforço de Obama para combater aquela linha de ataque foi completamente minado pelos pastores da Trinity United Church of Christ de Chicago, um lugar que pode até fazer bem à alma mas que é potencialmente maléfico a um aspirante à Presidência.

Primeiro, veio o reverendo Jeremiah Wright e seus sermões em vídeo. Ele não criticou somente os Estados Unidos, mas os condenou. A controvérsia de Wright foi um soco direto na campanha de Obama, e ele não se recuperou totalmente ainda.

Fiz um comentário na coluna da semana passada afirmando que Hillary, que não tinha nenhum caminho concreto para chegar à indicação, estava justamente esperando por um reverendo Wright para ampliar seus horizontes.

Há poucos dias, vimos o vídeo assustador de Michael Pfleger, um sacerdote católico responsável por um sermão grotesco em sua igreja, que certamente foi mais ofensivo aos brancos e, pessoalmente dirigido a Hillary Clinton.

O seu discurso violento, aplaudido pelo público, foi um dos piores que vi em muitos anos. Obama anunciou no sábado que estava deixando de freqüentar a igreja.

Achava-se que este seria o ano dos democratas. Mas, em vez de marchar para a vitória, o partido esteve preso a uma guerra inimaginável. Houve um tempo, e não faz tanto tempo assim, em que os eleitores democratas se sentiam felizes ao falarem de todos os seus potenciais indicados. Mas os partidários de Hillary e Obama passaram meses lutando amargamente num terreno arenoso que envolvia racismo e religião, e o discurso da superioridade democrata se perdeu.

Este deveria ter sido o ano dos democratas justamente porque eles planejavam mudanças em relação aos republicanos na economia, na guerra, na política energética, no sistema de saúde, nas nomeações da Suprema Corte, na reconstrução de Nova Orleans, entre outros temas. Uma lista de temas em que os republicanos hoje são extremamente vulneráveis.

Em vez de partirem para a defensiva, os republicanos estão cada vez mais confiantes de que John McCain vencerá essa corrida.

Muitos são os culpados entre os democratas pela atual situação. Os Clinton comportaram-se de forma execrável. Mas líderes do partido também se acovardaram, não tiveram coragem para tomar as decisões que deveriam ter sido tomadas.

Quanto a Obama, ele foi alvo de problemas e ataques que o atingiram justamente nas questões que o fizeram ganhar proeminência nacional, especialmente o fato de ser um candidato que, todos pensavam, pudesse unir o partido e o país.

Podem os democratas ainda caminharem juntos nesta eleição? Somente se agirem rápido. O partido terá que demonstrar uma extraordinária unidade, se recuperando rapidamente destas longas de desgastantes primárias. Obama terá que desenvolver (de novo rapidamente) um excepcional programa econômico enquanto todos tentam melhorar seu apelo em diversos segmentos sociais. O fato é que os democratas causaram muito mais danos a si mesmos do que os republicanos poderiam ter feito.

BOB HERBERT é colunista do New York Times