Título: O combustível da corrupção
Autor: Bottari, Elenilce
Fonte: O Globo, 07/06/2008, Rio, p. 16

Quadrilha impediu extorsão contra empresa que teria contribuído para campanha de Lins

As investigações da Operação Segurança Pública S/A, da Polícia Federal em parceria com o Ministério Público Federal, sobre uma quadrilha formada por policiais dentro da estrutura do estado, revelaram uma política de manter empresas funcionando irregularmente, para a prática de extorsão. Um caso flagrado por uma escuta foi o da empresa Pinheiro Paes Transportador Revendedor Retalhista de Combustíveis, com sede em Campos e filiais em Duque de Caxias e no município capixaba de Serra.

Na conversa telefônica captada em 27 de outubro de 2006, o inspetor Mário Franklin Leite Mustrange de Carvalho, o Marinho, tesoureiro da campanha eleitoral do deputado Álvaro Lins (PMDB), pede ao delegado Daniel Goulart que interceda para impedir uma extorsão que estaria sendo praticada contra a empresa de combustíveis por uma equipe da Polinter. Na gravação, o inspetor explica ainda que a Pinheiro Paes havia contribuído muito para a campanha.

Segundo relatório da PF, a organização criminosa receberia vantagem ilícita dos "colaboradores" justamente para evitar que outros policiais civis achacassem as empresas.

"A Polinter gostou de ir dar uma achacada"

Na conversa gravada, Marinho pede a ajuda a Daniel e explica o problema. "Daniel, vê se você me ajuda aqui, filho. Temos um empresário amigo nosso aí, que ajudou a gente aí, é... tem uma equipe da Polinter, lá na empresa dele, com a... problema de denúncia, querem vasculhar lá a empresa dele. Esse cara sofre isso constantemente, tá? Vou te explicar. A gente entrou no circuito... conheceu ele justamente por causa disso. Nós conseguimos... é... minimizar muito essa situação dele. Só que justamente a Polinter, a Polinter gostou de ir lá dar uma achacada nele", diz o inspetor.

Marinho fala depois sobre a importância da empresa para a campanha: "É, é a empresa do cara, chama-se, é, Pinheiro Paes, em Duque de Caxias. Pinheiro Paes, é empresa distribuidora de combustível. Ajudou muito na campanha, muito, muito, muito, mesmo. Entendeu? O cara é todo certinho, já teve um problema na Defraudações, a gente já conseguiu ajudar ele, entendeu? Conseguimos provar que ele não tinha nada, mas a Polinter tá lá agora e era a que mais gostava de ir lá, entendeu? Espetar ele".

A empresa respondeu a inquérito em 2004, com base na lei 8.176, que trata de adulteração de combustíveis. O inquérito foi encaminhado para a I Central de Inquéritos em 2005 e em dezembro daquele ano foi redistribuído para a Promotoria de Campo Grande, onde foi arquivado. Só no ano passado, a mesma empresa sofreu dois flagrantes da Delegacia de Defesa Serviços Delegados, com base na mesma lei. Num deles, em 19 de outubro de 2007, policiais prenderam o gerente financeiro da Pinheiro Paes, Alberto Luiz Barreto Costa, e o motorista Paulo Rodrigues Pessoa. Os dois foram autuados por crime contra ordem econômica e tributária.

Apesar de a empresa ter autorização da Agência Nacional do Petróleo (ANP) apenas para vender diesel e óleo combustível, policiais encontraram na sede, em Campos, um caminhão com 15 mil litros de álcool hidratado. Dados da ANP mostram ainda que a empresa recebeu cerca de cem autos de infração em suas três sedes e sofreu oito interdições. As razões das autuações e interdições vão desde equipamentos em desacordo com a lei, adulteração de combustíveis até rompimento de lacre da ANP, considerado crime federal. Ainda segundo o órgão, a empresa até o momento não se recadastrou.

O GLOBO procurou os representantes da firma em Caxias e Campos. Nos dois endereços, foi informado que a empresa está fechada há tempos. No entanto, consta na ANP um auto de infração de 11 de abril deste ano, em Caxias, por operar sem autorização da agência.

O MP Federal e a PF também investigam possível crime eleitoral. Segundo Marinho, a empresa teria contribuído muito para a campanha de Lins. No entanto, no site do TSE, não constam doações da firma ou de seus donos para Lins ou para o PMDB. O site do TSE informa que a empresa contribuiu com R$20 mil para outras campanhas: R$15 mil para a de Charles Cozzolino (PAN-RJ) e R$5 mil para a de Jane Cozzolino (PTC-RJ).

COLABOROU Fábio Vasconcellos