Título: Governo se adianta para evitar CPI
Autor: Doca, Geralda; Ribeiro, Erica
Fonte: O Globo, 06/06/2008, Economia, p. 28

Senado marca depoimento de ex-diretora da Anac. Objetivo é blindar Dilma

BRASÍLIA. O Palácio do Planalto avalia que a denúncia de que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pressionou a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) a aprovar a venda da VarigLog para um fundo americano tem potencial de desgaste muito maior que o do recém-concluído episódio do dossiê sobre gastos corporativos. Há consenso de que a ex-diretora do órgão Denise Abreu, autora da denúncia, está disposta a ir para o embate, postura completamente diferente da adotada por José Aparecido Pires, que vazou à oposição o levantamento de gastos do governo Fernando Henrique Cardoso e sempre manteve diálogo com o governo e o PT.

Temendo a instalação de uma CPI, conforme ameaça da oposição, o governo preferiu tomar a dianteira e apresentou requerimento à Comissão de Infra-estrutura convidando Denise a prestar esclarecimentos. Seu depoimento foi marcado para a próxima quarta-feira.

Foram aprovados ainda os convites a mais 11 pessoas, entre elas ex-diretores da Anac, o juiz Luiz Roberto Ayoub, que cuidou do processo de recuperação judicial da Varig, Roberto Teixeira, advogado dos compradores da Variglog e compadre do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acusado por Denise de fazer lobby no Palácio do Planalto.

Oposição descarta CPI por enquanto

A ordem no núcleo do governo é evitar a todo o custo a convocação de Dilma em qualquer comissão, como desejam o PSDB e o DEM. A tentativa será restringir o caso a uma decisão da Justiça em favor da Varig. O objetivo é blindar a ministra, pois o governo teme que ela tenha virado alvo político depois de ter ganhado visibilidade como a favorita de Lula a sua sucessão em 2010.

A senadora Ideli Salvati (PT-SC) queria barrar qualquer iniciativa da oposição de convocar Denise, mas a confirmação da pressão por outros dois diretores da Anac - Leur Lomanto e Jorge Velozo - levou o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, e o líder do governo no Senado, Romero Jucá, a convencerem a líder do PT a mudar de tática.

A oposição, por sua vez, decidiu averiguar primeiro a consistência das denúncias para ver se a munição é suficiente para ampliar a briga política.

- Vamos ouvi-la (Denise) para ver o nível das denúncias, e se ela tem como comprovar esses fatos, que são gravíssimos. Não estão ainda nas nossas cogitações a criação de uma CPI - disse o líder do Democratas, senador José Agripino (RN).

Ontem, era forte no governo o questionamento sobre as motivações de Denise. Antes de ir para a Anac, ela havia trabalhado na Casa Civil com o ex-ministro José Dirceu, mas não foi mantida no cargo por Dilma.

- Eu acho que tem uma dosagem alta de ressentimento - afirmou José Múcio. - Precisamos tirar do ressentimento o lado positivo, esclarecer e elucidar as questões que forem fundamentadas. Quem quer se antecipar e tem interesse no esclarecimento das coisas é o governo.

Nos bastidores, o Planalto aposta que, desde que deixou a Anac, em agosto de 2007, Denise iniciou uma aproximação com integrantes da oposição e estaria sendo encorajada.

- Está claro que a Denise Abreu não está agindo sozinha. Por que ela resolveu só falar agora? Qual o motivo de ela ter ficado em silêncio no ano passado, durante o seu depoimento na CPI do Apagão Aéreo? O que chama atenção é que ela decidiu falar justamente na semana em que foi encerrada a CPI do Cartão Corporativo - ressaltou o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP).

Anteontem, Denise afirmou que tem documentos provando a pressão da Casa Civil na venda da Varig.

Outra preocupação do governo é o fato de Denise ter mirado em outro alvo próximo do Planalto: Roberto Teixeira. Na avaliação de um ministro, Denise quis, na verdade, acertar Lula. Ao ressuscitá-lo, emerge o histórico polêmico do advogado - sempre nos bastidores de escândalos mal explicados.

É o caso da Consultoria para Empresas e Municípios (Cpem), epicentro de uma das primeiras denúncias de corrupção contra o PT. Representada por Teixeira, oferecia a prefeituras uma fórmula para alavancar a arrecadação de ICMS em troca de 20% do aumento conseguido. A consultoria foi contratada sem licitação por 12 administrações municipais petistas.

Mais recentemente, ressurgiu na CPI do Apagão Aéreo. Teixeira esteve envolvido em três negócios polêmicos do setor: a venda da Varig para a Gol, a montagem da VarigLog e a falência da Transbrasil.