Título: É preciso cuidar mais das cidades
Autor: Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 08/06/2008, O País, p. 12

Doutor em ecologia pela Universidade de Montpellier (França), Evaristo de Miranda há mais de 25 anos realiza pesquisas e expedições na Amazônia e tem livros publicados no Brasil e no exterior. Chefe-geral do monitoramento por satélite da Embrapa, ele defende investimentos nas cidades para salvar as florestas.

Soraya Aggege

O que acha do aumento do desmatamento da Floresta Amazônica?

EVARISTO DE MIRANDA: Não se desmata por pura maldade. As razões são sociais e econômicas. A Amazônia, uma das regiões mais pobres e atrasadas do Brasil, tem a economia regional que mais cresce. Seu ritmo de PIB é duas vezes o do país. Em três anos, a região cresceu 22,4% enquanto o Brasil, 10%.

Obras do PAC podem prejudicar o bioma?

MIRANDA: Investimentos nas áreas urbanas são fundamentais. Para salvar a floresta, é preciso cuidar das cidades, mais do que das árvores. Quando a cidade gera emprego e renda, atrai mão-de-obra do campo e alivia a pressão sobre a floresta. Ao fortalecer as atividades econômicas e melhorar as condições de vida nas cidades, as obras do PAC poderão ampliar a sustentabilidade na Amazônia.

A agricultura também poderia ajudar na redução do desmatamento?

MIRANDA: Sim. Para atender às demandas da região sem desmatar, é preciso dobrar a produtividade das culturas, das pastagens e dos rebanhos na Amazônia.

Por que é tão difícil produzir um zoneamento ecológico na região?

MIRANDA: O ordenamento territorial é a base do desenvolvimento sustentável e seu primeiro passo é o zoneamento, previsto desde a Constituição de 88. Até hoje não saiu do papel, mesmo com muito dinheiro e tinta gastos com isso. Um bom zoneamento descontenta a todos um pouco. O que ele propõe é um compromisso aceitável por todos, negociado. Não pode ser deixado na mão de um setor específico. As atuais propostas são setoriais e exacerbam os conflitos.

O que é possível fazer pela floresta?

MIRANDA: Os europeus desmataram 99,7% de suas florestas. Talvez possam pagar pelos serviços ambientais planetários no Brasil, que mantém 69,7% de sua vegetação nativa.