Título: Varig: Procuradoria da Fazenda sofreu pressão
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 08/06/2008, Economia, p. 42

Segundo ex-procurador, Planalto foi contra parecer que isentava comprador da aérea de assumir R$2 bi em dívidas

BRASÍLIA. A ação do governo para concretizar a operação de venda da Varig também atingiu a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN). O ex-procurador-geral da Fazenda Nacional Manoel Felipe Brandão admitiu ao GLOBO ontem que sofreu pressões do Palácio do Planalto para mudar seu parecer relativo à operação, no qual entendia que o comprador da Varig deveria assumir as dívidas tributárias da empresa com a União, em torno de R$2 bilhões.

- Houve uma pressão, que é comum quando há entendimentos técnicos diferentes sobre algum assunto - disse Brandão, que deverá ser convocado pela oposição para falar na Comissão de Infra-estrutura do Senado.

Segundo Brandão, seu parecer apenas confirmava o que diz a lei de recuperação judicial: que uma empresa do perfil da Varig não poderia se dividir para ser vendida. O ex-procurador afirma que uma companhia com patrimônio, e que esteja em dificuldades financeiras, pode vender unidades produtivas que ajudem a reunir recursos para honrar suas dívidas. O que não era o caso da Varig.

- A Varig não tinha patrimônio nem unidade produtiva para vender. O que acabou comprado foi o direito de uso do nome e os espaços da empresa nos aeroportos - afirmou ele.

Com a saída de Brandão do comando da PGFN, seu sucessor, Luiz Inácio Adams, emitiu um parecer favorável ao que o Planalto queria: que a Varig poderia ser vendida sem sucessão tributária, ou seja, sem o repasse da dívida ao novo comprador.

Ontem, o ex-procurador-geral evitou polemizar ou fazer análises sobre o que teria levado o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a substituí-lo por Adams. No entanto, ele admitiu que o caso Varig foi um elemento importante para sua saída:

- Sofri resistência. Tanto é que saí. Minha situação ficou insustentável.

Sua troca por Adams foi cercada de polêmica. Os dois tinham diferenças não só em relação à Varig, mas também sobre a forma de condução da carreira dos funcionários da PGFN. A rivalidade dividiu a equipe da Procuradoria, e muitos integrantes ligados a Brandão também deixaram os cargos com sua saída.

A venda da Varig será discutida na quarta-feira na Comissão de Infra-estrutura do Senado, que ouvirá depoimentos da ex-diretora da Anac Denise Abreu - que acusou a Casa Civil de favorecer o comprador da Varig - e outros diretores envolvidos nas negociações em 2006. A convocação foi aprovada a pedido da própria base governista.

A oposição quer ampliar a lista de depoentes, incluindo Brandão. E, segundo o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), não está descartada a possibilidade de uma CPI para investigar as pressões do governo.