Título: Não mudaremos um centímetro
Autor: Tabak, Flávio
Fonte: O Globo, 12/06/2008, O País, p. 9

Presidente do TRE do Rio avisa que, mesmo com decisão do TSE, vai impugnar candidatos com ficha suja

Um dia depois de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidir que políticos que respondem a processos criminais podem se candidatar nas eleições, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) reafirmou que vai barrar quem tenha ficha suja. Para o desembargador Roberto Wider, os ministros do TSE tomaram uma decisão cautelosa, mas poderão mudar de idéia ao julgar as impugnações caso a caso. O presidente mandou um recado para os pré-candidatos que festejaram a decisão do tribunal: "Eles devem continuar muito preocupados, sejam os que pretendem ser prefeitos ou vereadores".

Flávio Tabak

Por que o senhor diz que a decisão do TSE não vincula os outros tribunais regionais do país?

ROBERTO WIDER: Porque não é um ato jurisdicional. Houve uma decisão de um processo de cunho administrativo. Por isso não vincula os tribunais inferiores nem os juízes de primeiro grau. Julgaremos de acordo com nossas consciências. Acredito que os senhores ministros adotaram a postura por uma questão de cautela num primeiro momento para ver quais critérios serão adotados. Isso não significa que amanhã, ao julgar casos específicos, não possam mudar. Espero que isso ocorra. O fato de três ministros afirmarem que nossa bandeira é legítima já é mais do que suficiente para continuarmos nessa luta. Se sete tivessem respondido negativamente, ficaria preocupado, mas o placar de quatro votos a três demonstra que tem fundamento o que queremos fazer.

O que o senhor diria para os pré-candidatos a prefeito e vereador com ficha suja que festejaram a decisão do TSE?

WIDER: Aviso que continuem muito preocupados, porque o TRE-RJ não modificará sua posição. Respeitaremos a consulta do TSE, mas com a observação do respaldo de três ministros. Não mudaremos um centímetro. Os partidos também têm que pensar nisso. Quem decidirá é o eleitor, que respondeu de forma positiva nas eleições de dois anos atrás. Nenhum dos que apresentaram ficha suja foi eleito. Este ano vamos nos livrar de mais seis, 60 ou 600 maus candidatos. Acredito que há um número muito grande.

O melhor caminho para barrar candidatos com vida pregressa discutível não seria a criação de uma lei complementar de inelegibilidade, que não dependesse do trânsito em julgado?

WIDER: Lógico, mas aí os políticos não tiveram interesse em fazê-la. O parágrafo nono do artigo 14 da Constituição diz que essa lei deve estabelecer regras pra proteger a probidade administrativa. Podemos utilizá-lo como princípio. O artigo 37 fala da moralidade como um dos pressupostos da atividade pública. Não estamos inventando uma coisa nova, e sim criando uma interpretação integrativa da Constituição para exigir isso.

Como o senhor espera que o TSE reveja a decisão?

WIDER: Estou no início de um processo que já deu resultado na eleição passada, pois ficamos livres de seis maus candidatos. Tenho esperança de que o TSE reveja isso no julgamento de casos específicos. Três ministros votaram contra, e os que votaram a favor da posição antiga manifestaram preocupação anteontem. Eles terão toda a oportunidade de modificá-la posteriormente. Mesmo que não alterem, o TRE-RJ dará o exemplo para o eleitorado do Estado do Rio. As condições de inelegibilidade na lei são rígidas. Estamos trabalhando agora na elegibilidade. Quem pode ser eleito? São aquelas pessoas que, pela sua vida pregressa, demonstrem esses princípios, todos presentes Constituição. Ninguém contrata um empregado com ficha suja.

O senhor espera que essa postura seja mantida por futuros presidentes do TRE-RJ?

WIDER: O problema não sou eu, é a instituição que está atuando nessa linha. Não sou importante no processo. O vice-presidente do tribunal, Alberto Motta Moraes, assumiu o mesmo compromisso que eu. Acredito que isso possa se tornar um movimento no país todo.