Título: Inaugurar hospital pode ser bom só para o prefeito
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 13/06/2008, O País, p. 3

BERNARD COUTTOLENC

SÃO PAULO. PhD em Economia da Saúde pela John Hopkins University, Bernard Couttolenc, da USP, "fez e refez" as contas com o colega Gerard la Forgia, a quem ajuda nas palavras complicadas do português, mas não teve jeito: a nota do Brasil é baixa mesmo quando se trata de eficiência hospitalar. E o problema, dizem, está longe de ser sanado apenas com mais dinheiro.

Tatiana Farah

O novo imposto, a CSS, vai ajudar o país?

BERNARD COUTTOLENC: Recursos são sempre bem-vindos. O problema é a forma de gastar esse dinheiro. Tem de gastar bem. Sem melhora de qualidade, não adianta. O dinheiro não pode entrar no geral do financiamento de saúde.

O senhor disse que 60% dos leitos, segundo o Ministério da Saúde, estão ociosos, mas há gente morrendo à espera de um leito. Por que isso acontece?

COUTTOLENC: É a má gestão da qual tratamos hoje. Inaugurar um hospital pode ser bom para o prefeito, mas nem sempre é bom para a população. O hospital não é a solução para tudo. Quanto aos leitos, grande parte dos que estão desocupados nem está em condições de estar ocupada (pela precariedade).

Há mesmo leitos sobrando?

COUTTOLENC: Quando a gente diz que a taxa de ocupação é de 37%, é a média nacional. Uma parte desses leitos não está nem tem condições de ser ocupada. A gente precisa ser cuidadoso com essa história de fechar leito porque é um raciocínio simplista dizer que tem 60% de leitos ociosos. Precisa-se de uma política mais ampla de racionalização da oferta de serviços hospitalares. Isso vai contemplar a todos.

Qual o impacto dessa ineficiência sobre o paciente?

COUTTOLENC: Ele sofre um reflexo direto. Se o dinheiro é mau usado, vai faltar medicamento. Vai faltar o tratamento adequado.

Se o senhor levasse o hospital para o hospital, quais seriam as medidas de emergência para salvá-lo?

COUTTOLENC: Não há como resolver tudo em dois meses. Mas temos de tomar medidas o quanto antes. É importante fazer uma reforma, ver como eles são gerenciados. Como são feitos os mecanismos de pagamento (financiamento).

A pesquisa do Banco Mundial considerou o fator corrupção como um dos custos do gerenciamento nos hospitais do Brasil?

COUTTOLENC: Não entramos nesse campo, mas, sem dúvida, a corrupção é um dos custos e gera dispêndios, sim.

Os senhores defendem os modelos de Organizações Sociais de Saúde (OSS). Mas como controlar isso em um hospital?

COUTTOLENC: O modelo tradicional de gestão pública implica que todos os controles ou quase todos sejam sobre os processos, quantas consultas foram feitas. Esse modelo não se preocupa em avaliar resultado. Então, é um modelo burocrático, pesado. Você precisa de autorização para pegar isso aqui, mas não dá conta do impacto. Mas o modelo de OSS que responsabiliza o gestor pelo resultado é muito mais flexível e dá mais certo. Não é mais frouxo, não, do que tentar amarrar com o orçamento, que precisa de autorização para comprar isso, aquilo. Agora, o modelo de contratação só funciona bem se o contratante sabe fazer a parte dele, que é estabelecer metas e resultados e cobrar resultados.