Título: Política dúbia de Lula prejudica, diz estudioso
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 15/06/2008, O País, p. 14

Para sociólogo, presidente mantém grupos por perto, mas sem atender a suas reivindicações

SÃO PAULO. Compreendidos ou não pela sociedade, politicamente os movimentos camponeses do Brasil estão em uma "sinuca de bico", avalia o sociólogo Ricardo Antunes, estudioso dos movimentos sociais brasileiros e docente da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Antunes lembra que esses movimentos eram da base social do hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E que, até agora, quase no meio do segundo mandato, Lula não mexeu na estrutura fundiária do país e ainda se coloca como porta-voz do agronegócio.

- Essa situação é muito difícil para os movimentos sociais. O governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso, foi pior para eles, porque os criminalizou. Com Lula, isso não aconteceu, mas a história é ainda mais complicada - diz Antunes.

Para o estudioso, a política de Lula com os movimentos é dúbia: ele tenta manter os grupos sob seu arco de influência, sem criminalizar, liberando cestas básicas, mas sem atender a suas reivindicações.

- O MST é muito estruturado, organizado, e historicamente apóia Lula. Mas Lula opta claramente pelo agronegócio e usa a política das torneiras pingando para exercer certo controle sobre o movimento. Hoje, se o MST não se mobiliza, as torneiras não pingam. É uma sinuca de bico - afirma.

Antunes analisou a pesquisa e considerou que há muitas ambigüidades sobre a imagem dos movimentos. Frisa que, como 90% dos entrevistados afirmam que se informam sobre os movimentos pela televisão e pela imprensa, trata-se de uma opinião sobre o que foi publicado.

- Geralmente, o que a mídia mostra são conflitos, ocupações. Não mostra ações de escolarização, famílias que conquistam dignidade graças à ação dos movimentos.

Também especialista em movimentos sociais, o cientista político mexicano Adrian Gurza Lavalle, professor da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), avalia que a percepção de violência se deve muito ao que aparece na mídia.

- Apesar do protagonismo, o MST tem cisões, facções e não é único. Há outros. A causa do MST, a reforma agrária, é unanimidade mundial. Os métodos, no entanto, são polêmicos - afirma Lavalle.

Ele considera que a pesquisa traz um dado importante:

- O conhecimento que as pessoas demonstram ter dos movimentos sociais não é desprezível: 97% conhecem o MST no Brasil. Ora, as taxas de engajamento dos brasileiros em associações e partidos são de apenas 20%.