Título: Cid Gomes distribui recursos públicos
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Fonte: O Globo, 14/06/2008, O País, p. 4

Parlamentar que votar pelo Ceará terá R$800 mil para aplicar em seu reduto

Isabela Martin

Em troca do apoio dado a dez emendas parlamentares de interesse do estado, o governo do Ceará vai pôr à disposição R$800 mil para cada um dos 25 representantes da bancada federal no Congresso destinar o dinheiro a obras ou serviços em suas bases eleitorais. A distribuição de verbas para deputados e senadores totaliza R$20 milhões, que sairão do Tesouro estadual.

O mecanismo de distribuição de verbas públicas do estado para deputados federais destinarem a seus redutos foi oficializado por um decreto do governo Cid Gomes (PSB) no ano passado e batizado de Programa de Cooperação Federativa (PCF). O parlamentar poderá escolher projetos em municípios de sua preferência para investir os recursos. A verba será repassada diretamente às prefeituras, mediante um termo de ajuste celebrado com uma secretaria estadual relacionada à obra ou serviço. O dinheiro poderá ser requisitado pelos 22 deputados federais e três senadores cearenses.

No ano passado, também através do PCF, o governo do estado já havia aberto os cofres para os 46 deputados estaduais, dos quais apenas dois lhe fazem oposição. Cada um tem direito a R$500 mil, totalizando mais R$23 milhões.

O governo nega que se trate de negociata. A disputa para privilegiar currais eleitorais não é novidade. Mas, ao criar uma cota anual para cada parlamentar, o governo Cid Gomes (PSB) formalizou a intermediação política para destinação de verbas públicas.

- O governo está inteligentemente recuperando práticas do passado. Estão fazendo isso de forma engenhosa. Mas é clientelismo puro - disse o deputado estadual Adahil Barreto (PR), um dos dois integrantes da oposição na Assembléia Legislativa.

O coordenador da bancada cearense no Congresso, deputado Arnon Bezerra (PTB), pondera que o dinheiro é uma compensação pelo fato de terem deixado de indicar emendas em suas bases para apoiar projetos de interesse do estado, que somam mais de R$215 milhões, como a ampliação do Porto do Pecém e o projeto cinturão digital, uma rede de banda larga que será instalada em várias regiões do estado.

A bancada federal na Câmara é formada por sete deputados do PMDB, dois do PSB, um do PTB, três do PT, dois do PP, quatro do PR, dois do PSDB e um do PCdoB. Os três senadores são do PSDB, PDT e PCdoB. Com exceção do PR, os demais partidos são aliados do governo estadual.

O secretário da Controladoria e Ouvidoria Geral (Secon), Aloísio Carvalho, escalado ontem pelo governo para falar sobre o assunto, disse que essa é uma forma de fortalecer as ações municipais e de beneficiar até mesmo o parlamentar que não apóie o governo.

- Dentro do foco de fortalecer as ações municipais está se possibilitando que o deputado, aderente ou não ao governo, tenha direito de receber esses R$800 mil e aloque onde achar conveniente - disse o titular da Secon.

Para o deputado Adahil Barreto, se houvesse uma "convicção republicana" no gesto, o governo deveria acatar e executar as emendas dos parlamentares ao orçamento.

De acordo com o secretário da Controladoria e Ouvidoria, os R$43 milhões que os parlamentares da bancada federal e estadual terão direito não vão onerar os cofres públicos porque o governo tem lastro para isso.