Título: Entidades consideram decisão judicial uma afronta à liberdade de imprensa
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 18/06/2008, O País, p. 4

Para a ANJ, condenação aplicada pela Justiça desrespeita a Constituição

BRASÍLIA. Entidades jornalísticas, juristas e políticos da oposição e do governo criticaram ontem a aplicação de multas à "Veja", à "Folha de S.Paulo" e à pré-candidata do PT à prefeitura de São Paulo, Marta Suplicy, pela publicação de entrevistas concedidas por ela aos dois órgãos de imprensa.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) divulgou nota de protesto contra a decisão da Justiça Eleitoral. No documento, assinado pelo vice-presidente Júlio César Mesquita, a entidade afirma que a aplicação das multas constitui uma afronta à liberdade de expressão: "Não é possível considerar como propaganda eleitoral aquilo que, obviamente, é matéria jornalística. Isso é subestimar a capacidade de discernimento dos leitores e dos cidadãos. Não é possível também, em desrespeito ao que determina a Constituição e ao espírito de um regime democrático, determinar aquilo que a imprensa pode ou não publicar. Isso é censura".

A ANJ também pediu que as instâncias superiores da Justiça suspendam a aplicação das multas: "A ANJ espera que a Justiça Eleitoral reveja essa absurda decisão. Se mantida, estará decretando o fim da liberdade de imprensa".

O presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azêdo, considerou a decisão grave afronta à liberdade de imprensa:

- A ABI reitera a sua conclusão de que atualmente o maior inimigo da liberdade de imprensa no Brasil é o Poder Judiciário. É preocupante a aplicação desse entendimento da Justiça Eleitoral, porque nos vemos diante do retorno à sonegação da liberdade de imprensa que vigorou durante a ditadura militar.

Para Azêdo, o Judiciário ignora a distinção entre propaganda eleitoral e material jornalístico. Mesmo entendimento tem o ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Célio Borja. Ele cobrou mais cautela a procuradores e juízes e disse que o Ministério Público e a Justiça Eleitoral não podem confundir jornalismo com propaganda política:

- A mera manifestação de idéias não pode ser confundida com propaganda - disse.

Na avaliação do jurista, a Justiça Eleitoral deve zelar pela manutenção do livre debate político, reservando ao eleitor a tarefa de julgar as idéias expostas pelos candidatos. Borja também frisou que os órgãos de imprensa não podem ser responsabilizados judicialmente pelas opiniões dos entrevistados:

- A ex-ministra é uma personalidade pública, que pode e deve expressar idéias publicamente. Se isso vai contra ou a favor dela, cabe ao eleitor decidir.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), considerou as multas abusivas:

- É uma prática comum entrevistar pessoas do mundo político.

O presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), concordou:

- Acredito que essa decisão deve mudar. Do contrário, levará às barras da Justiça todos os jornais e jornalistas.

Adversário político de Marta, o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP), também criticou a decisão judicial:

- Acho que essa decisão cerceia completamente a liberdade de imprensa. Não faz o menor sentido associar entrevista a propaganda eleitoral.

O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) reforçou as críticas às multas e disse que a questão pode ser levada ao STF:

- Cabe até recurso extraordinário ao Supremo, porque essa decisão ofende a plena liberdade de informação a que o cidadão tem direito pela Constituição.