Título: Lei de imigração é aprovada sob protestos na UE
Autor: Guedes, Luisa
Fonte: O Globo, 19/06/2008, O Globo, p. 37

Itamaraty lamenta novas regras. Brasileiros em situação ilegal chegam a mudar de hábitos para evitar exposição

Luisa Guedes

Políticos de esquerda, sindicatos e associações criticaram ontem a aprovação pelo Parlamento Europeu (PE) da lei que endurece o tratamento a imigrantes no bloco. Para eles, a lei não garante direitos aos "indocumentados", como são chamados os imigrantes sem documentação legal.

O texto - que afeta milhões de trabalhadores estrangeiros, ilegais ou não - foi aprovado na íntegra ontem por 367 votos a favor, 206 contra e 109 abstenções. Todas as emendas apresentadas por parlamentares de esquerda foram rejeitadas. A aprovação foi garantida pela direita nacionalista, pelo Partido Popular Europeu e pelos liberais. A nova lei permite, por exemplo, que imigrantes fiquem detidos por até 18 meses sem qualquer acusação criminal. E caso expulsos do bloco, não podem voltar por cinco anos.

O parlamentar socialista italiano Claudio Fava disse considerar a lei uma "aberração". Sua colega francesa Martine Roure tachou de "inaceitável" a permissão de deportação de menores de idade sem acompanhante a "países com os quais não têm nenhuma relação".

A Confederação Européia de Sindicatos (CES) emitiu nota dizendo temer que os dispositivos possam ferir direitos humanos fundamentais e qualificou de "inaceitáveis" os períodos de detenção estabelecidos, a proibição de retorno ao bloco e a possibilidade de deportação a países que não o de origem. A Anistia Internacional se disse "profundamente decepcionada" com a falta de segurança e de dignidade a que imigrantes estarão sujeitos.

Brasileiros deixam de ir ao cinema e evitam sair na rua

No Brasil, o Ministério das Relações Exteriores lamentou a decisão "que contribui para criar percepção negativa da migração e vai no sentido contrário ao de uma desejada redução de entraves à livre circulação de pessoas e de um mais amplo e pleno convívio entre os povos".

O medo de uma possível expulsão fez com que alguns brasileiros mudassem sua rotina em grandes cidades européias.

A carioca de 29 anos Fernanda, que preferiu não revelar o sobrenome, mora há dois anos ilegalmente em Barcelona, onde já trabalhou como garçonete e divulgadora de eventos. Agora sai pouco de casa, evita transportes públicos e passa os fins de semana na casa do namorado, temendo ser descoberta pela polícia, assim como foram dois de seus amigos brasileiros.

- Eu me sinto mais tranqüila porque estou fazendo os tramites para casar e ficar legal, mas acho que vai mudar muita coisa. Já estou até vendo mais policiais nas ruas. Vai ficar mais difícil até entrar aqui na Europa

Em Portugal, o operário paulista de 36 anos Esrael aguarda a cidadania italiana. Ele deixou de ir ao cinema e de praticar esportes para não se expor.

A precaução, no entanto, não evitou que ele recebesse, há 20 dias, uma carta de expulsão por estar em situação irregular. O prazo para a saída do país já venceu e agora ele conta com uma brecha da lei para não ser mandado de volta ao Brasil: começou a contribuir com a seguridade social portuguesa.

- Deixo de fazer muita coisa. Minha vida é casa, trabalho, trabalho, casa. E só vou ao mercado perto de casa - diz. - Enquanto não consigo o visto ou a cidadania, vou enrolando.