Título: MP agora quer punir também Estado
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 20/06/2008, O País, p. 4
Como a de Marta, entrevista com Kassab é contestada.
SÃO PAULO. O Ministério Público Eleitoral ingressou com mais duas representações contra a imprensa na Justiça. Desta vez, o jornal "O Estado de S.Paulo" e a revista "Veja São Paulo" são acusados de fazer propaganda extemporânea do prefeito Gilberto Kassab (DEM), pré-candidato à reeleição, devido a entrevistas feitas com ele. No início da semana, o juiz Francisco Carlos Shintate, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, condenou a "Folha de S. Paulo" e a "Veja SP" por entrevistas com a pré-candidata a prefeita Marta Suplicy, do PT. Marta e as empresas foram multadas e recorreram da decisão ao Tribunal Regional Eleitoral anteontem.
A decisão de primeira instância, que na prática proíbe entrevistas com pré-candidatos, foi criticada por juristas, magistrados e entidades de defesa da liberdade de imprensa. A organização internacional Repórteres Sem Fronteiras divulgou ontem nota contra a medida: "O caráter absurdo desta decisão, da qual esperamos uma rápida anulação, já foi denunciado tanto pelo poder Executivo como pelas instâncias superiores da Justiça. Sobretudo antes de eleições, a imprensa deve abordar a atualidade política, e o trabalho jornalístico não pode ser comparado a propaganda. (...) Durante a campanha eleitoral oficial, a igualdade na distribuição dos tempos nos meios de comunicação audiovisuais é necessidade real. Mas esse tipo de controle parece bem mais difícil na imprensa escrita e, de maneira geral, não tem razão de ser fora dos períodos de campanha. Consideramos que, por estes motivos, a lei deverá ser modificada", afirma a entidade.
Segundo o Departamento Jurídico do "Estado de S.Paulo", a entrevista contestada pelo Ministério Público foi publicada no dia 14 de junho. A empresa recebeu a citação judicial ontem e está preparando sua defesa. Uma das promotoras responsáveis pelas representações eleitorais, Maria Amélia Nardy Pereira, disse que não se proíbe que se entrevistem as pessoas:
- O que se proíbe é propaganda antecipada. Quando um candidato fala de plataforma de governo, pela lei das eleições, é vedado. Não há censura - disse a promotora, afirmando que o pré-candidato não pode criticar adversários porque, para ela, é propaganda antecipada.
O advogado André Hermanny Tostes, professor de Direito da PUC-Rio, avaliou como exagero a decisão da Justiça Eleitoral, mas disse que as condenações não são censura:
- Parece um certo exagero considerar uma entrevista como propaganda eleitoral. Mas, para isso, existem os recursos e, muito provavelmente, as instâncias superiores vão rever essa decisão. Mas chamar de censura é um equívoco, porque censura é um ato arbitrário, não sujeito a um contraditório. O que se tem é uma decisão judicial questionável, da qual se pode recorrer e obter uma revisão. Isso faz parte de um mundo com instituições funcionando.
Para o especialista, a condenação à "Folha" e à "Veja SP" não deverá abrir a porta para outras decisões desse tipo:
- Não acredito que aconteça, porque algumas instituições funcionam maduramente no Brasil. A imprensa é uma delas, a Justiça em níveis elevados funciona de uma forma madura. Os erros serão cometidos sempre, mas não vejo como impedimento para entrevistas.