Título: Pressão chinesa na bomba
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 20/06/2008, Economia, p. 23

Governo de Pequim sobe preços de gasolina e diesel em até 18%. Cotação do petróleo cai US$5.

Gilberto Scofield Jr.*

Amenos de dois meses do início dos Jogos Olímpicos, a China elevou ontem os preços da gasolina, do óleo diesel e de outros combustíveis em até 18%, numa decisão que pegou a população e os mercados de surpresa. A medida, que deve restringir a demanda por combustíveis no país, provocou uma queda significativa nas cotações do petróleo, que despencaram quase US$5 o barril. O aumento dos preços controlados dos combustíveis ocorre num momento em que a inflação no país se encontra em seu maior nível em quase 12 anos.

A decisão mostra que a China está acompanhando seus vizinhos Índia e Indonésia, que também ajustaram os preços subsidiados dos combustíveis diante do barril do petróleo perto dos US$140. Muitos analistas estimaram que Pequim esperaria o fim das Olimpíadas para adotar uma política impoular. A notícia provocou uma correria aos postos do país, com os chineses buscando encher os tanques de seus carros antes que o aumento entrasse em vigor hoje. Os preços de gasolina e diesel vão subir mil yuans (US$145,5 ou R$233,84) por tonelada métrica ¿ o equivalente a R$0,17 por litro.

¿Os preços globais do petróleo vêm subindo consistentemente, e os preços domésticos dos combustíveis na China ficaram defasados. A diferença revelou o tamanho da contradição entre oferta e demanda¿, disse o representante da Comissão de Reforma e Desenvolvimento Nacional, em pronunciamento oficial na TV.

País deve pressionar preços por 10 anos

Em Washington, onde participava de uma reunião comercial com os EUA, o presidente do Banco Central chinês, Zhou Xiaochuan, disse que a reformulação dos preços já havia sido planejada pelo governo. Ele afirmou ainda que o governo vai monitorar o impacto do aumento na inflação. A China também vai elevar em 1º de julho as tarifas médias de energia elétrica em cerca de 4,7%, que vai atingir, sobretudo, consumidores industriais e comerciais.

A notícia afetou os mercados de petróleo. Na Bolsa Mercantil de Nova York, o preço do barril do tipo leve americano recuou 3,5%, para US$131,93. Em Londres, o barril do Brent caiu 3,3%, para US$132. Nem as notícias de ataques rebeldes na Nigéria, que levaram a Royal Dutch Shell a suspender a produção de 200 mil barris diários, conseguiram segurar os preços. O rápido crescimento do consumo de combustíveis na China vem sendo um dos fatores de pressão sobre os preços da commodity.

¿ Isso é bastante significativo, pois mostra que o governo chinês está disposto a enfrentar o risco de impopularidade para conter a crescente demanda doméstica ¿ avaliou John Kemp, economista da RBS Sempra.

Porém, com a economia crescendo a taxas acima de 11% nos últimos seis trimestres e o consumo de petróleo ¿ de 340 milhões de toneladas ao ano (sete milhões de barris por dia) ¿ atingindo, ano passado, o dobro da produção interna ¿ 180 milhões de toneladas por ano (3,7 milhões de barris por dia) ¿, a China deve continuar pressionando as cotações do petróleo no mundo por, ao menos, dez anos, segundo o reitor da Escola de Administração de Negócios da Universidade de Petróleo da China, Zhen Wang.

Este é o tempo que o país precisa para sentir os resultados das medidas que começaram a ser adotadas ano passado para mudar sua matriz energética, excessivamente dependente de carvão (70%) e petróleo (21%). Tais características, somadas ao que muitos consideram um superaquecimento econômico do país, levaram a China a alcançar hoje a posição de segundo maior consumidor de petróleo do planeta (atrás apenas dos EUA), terceiro maior importador (atrás de EUA e Japão) e um dos principais emissores de gases do efeito estufa.

Já a Comissão Européia (CE) apresentará hoje aos líderes da União Européia (UE) dois documentos que sugerem que biocombustíveis como o etanol são armas importantes no combate à alta dos preços dos combustíveis e dos alimentos, desde que sejam produzidos de forma sustentável.

(*) Correspondente, com agências internacionais

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