Título: Campanha de Ódio
Autor: Saslow, Eli
Fonte: O Globo, 23/06/2008, O Mundo, p. 19

Movimentos de supremacia branca usam candidatura de Obama para atrair novos membros

Eli Saslow

Ahistórica vitória do senador Barack Obama nas primárias do Partido Democrata, celebrada no país como um símbolo de progresso nas questões raciais, também gerou um aumento em atividades de grupos racistas e que defendem a supremacia branca, principalmente na internet, de acordo com líderes dos chamados grupos de ódio e organizações que os estudam.

Neonazistas, skinheads e grupos segregacionistas têm registrado aumento no número de visitantes em seus sites e em adesões desde que o senador de Illinois assegurou no dia 3 de junho a indicação democrata. Sua vitória despertou uma comunidade de racistas preocupados com a possibilidade de o país eleger seu primeiro presidente negro, dizem especialistas.

¿ Não tenho visto tanto ódio em muito, muito tempo. Nada acordou mais os americanos pacatos e normalmente complacentes do que a possibilidade de um presidente não-branco ¿ disse Billy Roper, 36 anos, líder de um grupo chamado White Revolution em Russelville, Arkansas.

Racistas usam sites como plataforma

Historicamente, esses grupos costumam supervalorizar sua influência como forma de autopromoção e intimidação. Eles se recusam a divulgar o número de membros e não abrem as reuniões para jornalistas. Seus líderes admitem que seus números continuam reduzidos, porém especialistas dizem que as reivindicações agora escondem mais que hipérboles.

¿ A verdade é que está acontecendo uma explosão de sentimentos de ódio na internet. É um problema crescente ¿ diz Deborah Lauter, diretora de direitos humanos da Liga Antidifamação.

Grupos neonazistas e de supremacia branca admitem que têm pouca chance de deter a candidatura de Obama. Então, em vez disso, eles decidiram se valer dessa inabilidade. Líderes que antes temeram a campanha de Obama agora a consideram uma ferramenta de recrutamento. Eles passaram a retratar sua candidatura como um meio de ferir a cidadania dos brancos e polarizar o país.

Obama tem se esforçado para diminuir a importância da questão racial em sua campanha. Quando é questionado sobre divergências e sentimentos de ódio, prefere falar das formas de união entre brancos e negros que o inspiram. Ele decidiu ¿rejeitar e denunciar¿ a campanha do líder muçulmano Louis Farrakhan. Obama deixou sua igreja depois que seu pastor, o reverendo Jeremiah Wright, falou de racismo e opressão nos ¿Estados Unidos da América Branca¿.

No início do mês, a campanha de Obama lançou um site para combater falsos boatos que incitadores do ódio espalhavam na rede. O site lista uma série de inverdades sobre ele: que é muçulmano; que seus livros contêm trechos racistas; que sua mulher, Michelle, usou a palavra ¿branquelo¿.

Porém, o outro lado também está na briga. Em sua casa na Flórida, Don Black passa 16 horas por dia lendo centenas de comentários derrogatórios dirigidos a Obama e postados no Stormfront.org. Black, um ex-líder da Ku Klux Kan, lançou o site em 1995. Às vésperas de Obama conseguir sua indicação, o site, diz ele, começou a cumprir seus objetivos. Se em 2002 a página atraía poucos milhares de visitantes diários, hoje é o trabalho de Black em tempo integral e atrai mais de 40 mil usuários por dia.

¿ Recebo e-mails e mensagens privadas o tempo todo de gente que está irada com a idéia de Obama ser eleito ¿ diz Black, um ativista da causa branca desde os anos 70. ¿ Isso está apavorando muita gente que nunca antes se considerou racista, e os trazendo para o nosso lado.

Quase todos os líderes desses movimentos registram o aumento de novos membros. David Duke, um veterano na defesa da segregação racial, diz que as visitas ao seu site dobraram. Dan Hill, que comanda um grupo extremista no Michigan, afirma que seus aliados estão mais propensos a ¿tomar atitudes sérias¿ e organizar protestos contra políticos e a imigração.

Alimentados por sentimentos contrários à imigração, grupos de supremacia branca cresceram quase 50% desde 2000, segundo o Southern Poverty Law Center, que monitora os grupos de ódio. Esse novo fôlego tem levado supremacistas a discutir como conduzir o movimento. Até agora, seus adeptos pouco fizeram para atrapalhar a campanha de Obama. Hill, que costuma treinar técnicas militares e de sobrevivência, recentemente dirigiu até um comício de Obama e tentou ¿provocar as pessoas, talvez iniciar uma baderna¿. Esses grupos também desdenham de John McCain, pela visão moderada sobre imigração.