Título: Queda-de-braço acirrada
Autor: Almeida, Cássia; Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 26/06/2008, Economia, p. 21

Com inflação alta, petroleiros, metalúrgicos e bancários vão brigar por novos aumentos reais.

Com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que serve de base para as negociações salariais, acumulando alta de 6,64% nos últimos 12 meses, grandes categorias, como petroleiros, bancários e metalúrgicos, com data-base no segundo semestre, preparam-se para um embate mais acirrado. São mais de dois milhões de trabalhadores. Desde 2004, a maioria dos acordos salariais é fechada com ganhos acima da inflação. Em 2007, de acordo com o último levantamento do Dieese, 87,7% das negociações ficaram acima da inflação, que girava em torno de 4%, ou menos. Os sindicatos dos trabalhadores avisam: não aceitam menos do que conseguiram em 2007, ou seja, ganho real em torno de 2%, mais a inflação acumulada. A favor dos trabalhadores conta o bom momento da economia brasileira, principalmente no setor automotivo:

- As empresas não vão querer interromper a produção, no momento em que há fila para caminhões e carros. O momento é favorável - disse o secretário-geral da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, ligado à CUT, Valter Sanches.

A Anfavea, que negocia pelos patrões com trabalhadores das montadores, não comenta a questão.

"Mais lenha na alta dos preços"

Os bancários citam os lucros dos bancos e a expansão do setor para reivindicar ao menos o que ganharam em 2007, mas devem tentar até mais. E vão pedir reajuste maior para a cesta-alimentação, devido à alta dos alimentos, de 14,63% nos últimos 12 meses.

- Queremos ganho real, aumento da participação nos lucros e redução da parte variável do salário dos bancários. Essa questão é prioritária, diante do aumento de doenças de trabalho. É exigido um nível elevadíssimo de produção - disse Vagner Freitas, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT).

O debate não será fácil. Magnus Apostólico, superintendente de Relações de Trabalho da Federação Nacional dos Bancos e que negocia com os bancários desde 1995, diz que até o repasse total da inflação representará ganho real:

- Trabalhamos com inflação entre 6% e 7%. Um percentual acima da expectativa de alta de preços no próximo período, de 4,5%. Aumento real todo ano tornará o custo do trabalho insuportável. Por enquanto, a produtividade absorve esse aumento de custo. Quando afetar a competitividade, pode gerar desemprego. Será uma negociação difícil e técnica.

A alta dos preços prejudica o trabalhador, diz Hélio Seidel, coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP). Mas ele não espera que a categoria sofra corrosão de salários pois, nos últimos cinco anos, os trabalhadores da Petrobras têm tido ganho de real de 2%:

- A economia vai bem apesar da inflação, um fenômeno mundial. Se, ao contrário do esperado, a inflação se fortalecer, mudam os processos de negociação: vamos brigar, por exemplo, por mais de um reajuste anual ou pela volta do gatilho salarial.

A Petrobras, consultada, informou que ainda não avaliou a proposta que fará à categoria.

Para Carlos Reis, presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo, as negociações podem ficar mais duras no segundo semestre. Nos acordos fechados em maio e junho, houve reposição integral da inflação, além de ganho real. Algumas categorias tiveram reajuste acima de 11%.

- Os ganhos surpreenderam. Por isso, se essa conjuntura se mantiver, as negociações serão mais duras.

O diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, reconhece que as negociações ficaram mais difíceis, mas com um atenuante: a economia aquecida, principalmente nos setores com dissídio no segundo semestre.

- Pelos dados preliminares, a maioria dos acordos está sendo fechada acima da inflação. Nos setores mais dinâmicos, as empresas precisam contratar. Mas, em ramos que sofrem com a concorrência de importados, como o de calçados, a negociação pode ser mais dura. Assim, os ganhos reais podem ser menores.

Em 2007, 75% dos acordos foram fechados com até 3% de ganho real.

O economista Fábio Romão, da LCA Consultores, projeta ganhos reais entre 1% e 1,5% - abaixo dos 2% obtidos, em média, nas negociações de 2007. Mesmo com reajuste acima da inflação, o economista não prevê repasse para os preços.

- O freio na atividade econômica compensaria a alta nos salários.

Elson Teles, economista-chefe da Corretora Concórdia, acredita que os reajustes vão alimentar a inflação:

- Qualquer reajuste acima da inflação põe mais lenha na alta dos preços.

IPCA-15 É O MAIOR DESDE 2004 e INFLAÇÃO ENCOSTA NO TETO, na página 22

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