Título: Oferta de trabalho na contramão de economia
Autor:
Fonte: O Globo, 28/06/2008, Rio, p. 22
Estudo do Rio Como Vamos diz que ambiente de negócios na cidade é desfavorável ao desenvolvimento de microempresas
creio: ele reclama da concorrência dos que não regularizam os seus negócios
Selma Schmidt
Apesar de a economia do Rio ter mostrado importantes sinais de recuperação, essa tendência positiva recente não tem sido capaz de reverter significativamente a situação instalada nas últimas décadas no mercado de trabalho da cidade, que ainda tem uma alta taxa de desempregados e de pessoas vivendo na informalidade. É o que constata o grupo de trabalho, emprego e renda do Movimento Rio Como Vamos (RCV). Segundo o estudo, o problema está ligado ao ambiente de negócios, desfavorável ao desenvolvimento das pequenas empresas, mais especificamente dos estabelecimentos qualificados como ¿micro¿ e ¿nano¿, que contam com até dez empregados.
O RCV está convencido de que o dinamismo apresentado, ultimamente, pelas grandes empresas não será suficiente para solucionar questões crônicas do mercado de trabalho carioca. O movimento defende a necessidade de combinar esforços das diferentes esferas de governo, da iniciativa privada e da sociedade civil.
Microempresário critica carga tributária
O empresário Mário Cesar Quélhas, de 46 anos, que há três montou uma loja de som e acessórios para carros no Recreio e tem quatro empregados, sente na pele as dificuldades de manter um negócio regularizado. Ele lembra que um funcionário custa ao empregador mais do dobro do seu salário líquido:
¿ Os encargos sociais são altos. Além disso, há os impostos: ISS, ICMS e o Simples, que acabou virando mais um tributo. A carga tributária desestimula a abertura de empresas.
Tantas contas a pagar, diz Mário, acaba por criar uma concorrência desigual:
¿ Os empresários em situação regular compram nos mesmos fornecedores daqueles que são informais, mas têm de oferecer ao consumidor o produto por um preço mais caro.
Para traçar um retrato do trabalho, do emprego e da renda no Rio, o estudo priorizou a utilização de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. A última Pnad disponível é de 2006. Embora a pesquisa contenha informações das regiões metropolitanas, o RCV teve acesso a tabulações não convencionais, realizadas pelo IBGE para o Instituto Pereira Passos, da prefeitura.
Preocupação com índice de menores trabalhando
Ao analisar o mercado, o RCV constata que 62,5% das pessoas com mais de 15 anos residentes no Rio trabalham. Um índice 2,5 pontos percentuais superior ao de 2001. Esse crescimento, avalia o movimento, foi proporcionado sobretudo pela maior participação das mulheres. Metade das que estão em idade ativa trabalha ¿ taxa cinco pontos percentuais superior à do inicio da década.
Outro dado relevante é o aumento da participação de jovens de 15 a 17 anos no mercado de trabalho: já chega a 18,7%. Mais preocupante, segundo o estudo, é o percentual de meninos de 10 a 14 anos que trabalham ou procuram emprego: 3% em 2006.
A capital tem 3,1 milhões de pessoas economicamente ativas. A PEA (População Economicamente Ativa) do Rio cresceu 12% entre 2002 e 2006. De acordo com o RCV, as principais tendências da PEA revelam envelhecimento e maior escolarização, além do aumento da participação das mulheres.
Quanto ao desemprego, o RCV verifica que o problema atinge um em cada dez trabalhadores. Na Região Metropolitana do Rio, o desemprego é mais alto (12,1%), tendo ultrapassado a média brasileira (11,8%) pela primeira vez em 2006. As cariocas são mais afetadas pelo problema (12,6%) do que os homens (7,6%), um fenômeno nacional. A queda do desemprego entre 2001 e 2006 foi absorvida pelos homens.
O estudo mostra ainda que 24% dos jovens cariocas de 15 a 24 anos estão desempregados. Embora alta, essa taxa é inferior à da Região Metropolitana do Rio (27,3%) e à das regiões metropolitanas do Brasil (24,7%).
Além disso, afirma o RCV, entre 2001 e 2006, a taxa de desemprego dos jovens cresceu mais na cidade (1,2 ponto percentual) do que nas regiões metropolitanas do Rio e do Brasil (0,8 ponto percentual em ambas). O único grupo que apresentou redução do desemprego na capital foi o de pessoas com 50 anos ou mais.
Por escolaridade, a taxa de desemprego no Rio, entre 2001 e 2006, revela queda no grupo dos que não completaram o ensino fundamental. O maior índice de desemprego na capital atinge os trabalhadores que concluíram o ensino fundamental e não terminaram o ensino médio (14,2%). Embora o percentual de pessoas desempregadas que têm curso superior completo seja relativamente baixo (5,7%), a taxa cresceu expressivamente: 1,6 ponto percentual em cinco anos.
O estudo ressalta que o Rio tem 13% a mais de pessoas ocupadas do que em 2001. O melhor desempenho do nível de ocupação nesse período ocorreu em 2004 (crescimento de 8%), após a crise de 2003. Já a participação das mulheres no mercado de trabalho da capital (46,6%) é maior do que a da Região Metropolitana do Rio e a média brasileira.
Jovens até 24 anos: só 13,8% do mercado de trabalho
Ao avaliar o perfil etário, o RCV conclui que as pessoas ocupadas do Rio são mais velhas. Quase um quarto delas tem mais de 50 anos, enquanto os jovens de 15 a 24 anos representam apenas 13,8%.
Diferentemente da tendência das regiões metropolitanas de aumento da formalização dos empregos, no Estado do Rio, especialmente na capital, há um crescimento da informalidade. Isso pode ser visto pela queda do percentual de trabalhadores com carteira assinada no total de empregados.
O desemprego levou Francisco Carlos da Silva Sequeira a virar camelô. Há dez anos, ele sustenta a mulher e os três filhos com as miudezas que consegue vender na barraca instalada na esquina das ruas Santa Luzia e Calógeras, no Centro:
¿ Fui demitido e decidi entrar no mercado informal. Com o declínio econômico nas décadas de 80 e 90, muita gente seguiu o mesmo caminho.
Até a licença que ele tem para trabalhar na rua é informal. Francisco conta que seu nome consta de uma lista de ambulantes autorizados pela prefeitura, mas ele não tem documentos comprovando isso:
¿ Isso me deixa inseguro. Queria pagar pela licença e ter um papel.
Apenas 5% dos negócios são formalizados no Rio
Em 2005, os rendimentos do trabalho daqueles que moram no Rio foram 20% superiores aos da média da Região Metropolitana. Mas essa distância diminuiu entre 2001 e 2005, porque a renda do município teve queda um pouco maior do que a da Região Metropolitana. O estudo do RCV cita ainda dados recentes da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE, que indica uma recuperação dos rendimentos do trabalho na Região Metropolitana.
Ao abordar o mau ambiente de negócios no Rio, o estudo menciona o baixo associativismo, a alta informalidade e a falta de acesso a serviços financeiros e não financeiros. No Rio, a formalização atinge só 5% dos negócios ¿ menos da metade do percentual brasileiro ¿ e o índice de microempresários que têm crédito é o menor das regiões metropolitanas do país.
Em meio a diversidades, o RCV destaca o caráter empreendedor do carioca. A contribuição das microempresas da Região Metropolitana do Rio para a ocupação (40,7%) é superior à média brasileira. É alto ainda o percentual dos que abrem seu próprio negócio, porque valorizam a independência (20% na Região Metropolitana do Rio e 14,2% no resto do país). Os microempresários têm também como expectativa ampliar o negócio ou, pelo menos, continuar no mesmo patamar.