Título: Gilmar condena divulgar ficha suja
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 02/07/2008, O País, p. 3
Para presidente do STF, Justiça faz populismo se listar nomes de candidatos com processos
Bernardo Mello Franco
Opresidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, criticou ontem a decisão de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) de divulgarem listas dos candidatos com ficha suja que vão disputar as eleições de outubro. O ministro chamou a idéia de populista e disse que é muito grande a possibilidade de se cometerem injustiças na seleção e exposição dos políticos que respondem a processos criminais. Setores do Congresso e do próprio Judiciário têm defendido a divulgação dos nomes dos candidatos com problemas na Justiça, para alertar os eleitores, uma vez que eles não podem ser impedidos de concorrer.
- Tenho horror a populismo, e muito mais o populismo de índole judicial. Não me animo a ficar fazendo esse tipo de lista, porque tenho medo de cometer graves injustiças. Uma injustiça que se cometa será suficiente para questionar esse tipo de procedimento. De modo que, aqui, os senhores não me terão a favor disso - disse.
Gilmar também deixou claro que, em sua opinião, a divulgação de listas de candidatos sob investigação pode ser transformada em instrumento de luta política e, por isso, não deve ser endossada pela Justiça. Ele afirmou que é muito fácil provocar a abertura de um inquérito policial apenas para prejudicar um adversário político:
- A rigor, é muito fácil engendrar um inquérito criminal ou uma acusação contra alguém. O processo dialético que marca a política faz com que muitos integrantes da oposição, e essa é uma história que conhecemos bem, deixem de fazer a oposição parlamentar e sentem praça no âmbito do Ministério Público, fazendo representações contra adversários. E, a partir daí, se engendram processos.
Ministro alerta para chance de erros
Gilmar reclamou do termo ficha suja usado pela imprensa. Para ele, a possibilidade de erros submete o conceito a uma "imprecisão". Ele pôs em dúvida a legitimidade da Justiça Eleitoral para fazer as listas:
- Então, quais serão os critérios que nós vamos adotar?
O ministro admitiu, no entanto, que a sociedade civil e a imprensa se organizem para divulgar, por conta própria, as informações que julgarem necessárias sobre os candidatos.
- Eu não vejo com entusiasmo essa iniciativa por parte de órgãos judiciais. Claro, a comunidade que se organize, os partidos políticos que façam a sua seleção, a imprensa que publique e assuma as suas responsabilidades. Mas nós estamos num terreno extremamente sensível, e se podem cometer graves injustiças.
A divulgação de listas com os fichados pela Justiça já foi defendida pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Carlos Ayres Britto. Ele anunciou que o TSE divulgaria os nomes, mas voltou atrás, e disse que facilitaria o acesso, em seu site, a dados sobre a vida pregressa dos candidatos. O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Mozart Valadares, evitou polêmica, mas disse que a entidade levará adiante o projeto de fazer e divulgar as listas.
- Aceito a crítica do ministro e continuo a respeitá-lo, mas acho que a democracia não pode viver sem transparência. Vamos divulgar uma informação que é pública.
Na sessão de encerramento dos trabalhos do TSE, Ayres Britto comunicou o envio, aos presidentes dos tribunais e conselhos de contas estaduais e municipais, de ofício pedindo que disponibilizem a lista dos agentes públicos que tiveram contas rejeitadas por irregularidades insanáveis. Só entram nas listas pessoas já condenadas em instância final nos tribunais de contas e que não tenham sentença judicial favorável para recorrer da decisão.