Título: Lula:'Não brincaremos com inflação
Autor: Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 02/07/2008, Economia, p. 21

Presidente pede que economistas estudem especulação com "commodities"

Eliane Oliveira e Janaína Figueiredo

TUCUMÁN, Argentina, BRASÍLIA e SÃO PAULO. O presidente Lula afirmou ontem que o governo não vai brincar com a inflação e tomará todas as medidas possíveis para evitar alta generalizada dos preços. Lula lembrou que o Banco Central (BC) manteve o centro da meta em 4,5% para os próximos dois anos e revelou preocupar-se com o assunto desde 1959, quando arrumou seu primeiro emprego.

- Mantivemos o centro da meta em 4,5% e temos condições de produzir mais. Não brincaremos com a inflação - disse o presidente, depois da reunião de chefes de Estado do Mercosul e dos países associados ontem, na cidade argentina de Tucumán. - Isso (a inflação) não vai voltar a acontecer no Brasil.

Lula disse ter pedido a um grupo de economistas que estude "o que está por trás" do forte movimento especulativo dos mercados futuros de alimentos:

- Vamos ver o que existe de verdade no mercado futuro, que permite que um produtor de milho e soja venda a produção de três anos sem ter produzido.

Segundo uma fonte ligada ao presidente, Lula voltará a discutir o assunto com esses economistas amanhã. Eles são Delfim Netto, o senador Aloizio Mercadante, Luciano Coutinho, Luiz Gonzaga Beluzzo e integrantes da equipe econômica. A fonte explicou que a grande preocupação é com 2009 e 2010, os dois últimos anos de mandato.

Lula conclamou seus colegas sul-americanos a estudarem formas de combater a inflação. E responsabilizou os bancos de EUA e Europa pela crise:

- Os bancos europeus perderam 400 bilhões e não dizem nada. Quando perguntamos as causas, eles afirmam que ainda não têm informações. Se isso tivesse acontecido com um país da América do Sul, o FMI (Fundo Monetário Internacional) já estaria aqui dando palpites.

Em tom de ironia, Lula afirmou que houve coincidência entre os problemas no setor imobiliário americano e a crise atual. E disse que os EUA estão usando o dólar baixo para resolver seus problemas de déficits comercial e fiscal.

Já o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, propôs criar um fundo para alimentos. Este receberia US$1 para cada barril de petróleo vendido acima de US$100. Só com as contribuições venezuelanas, afirmou, o fundo teria US$920 milhões.

Lula também teve uma reunião bilateral com a presidente argentina, Cristina Kirchner. Ele disse que o Brasil continuará fornecendo energia para o país vizinho. Já Cristina confirmou a autorização do envio de 500 mil toneladas de trigo para o Brasil. Essas vendas sofreram restrições devido ao conflito com os produtores rurais argentinos.

Mantega garante que a situação está sob controle

Um dia após a divulgação da pesquisa CNI/Ibope que mostrou desaprovação no combate à inflação pelo governo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tentou tranqüilizar a base aliada. Em reunião com o Conselho Político no Palácio do Planalto, ele disse que a situação está sob controle e que a inflação não irá romper o teto de 6,5% da meta oficial em 2008.

Mantega lembrou medidas para conter a escalada de preços, como a criação do fundo soberano, que absorverá o equivalente a 0,5% do PIB este ano, enxugando gastos públicos. E que o BC retomou a alta de juros.

- O governo quer colocar água na fervura para que a inflação não se transforme num problema maior. Essas ações também ajudam a controlar o efeito psicológico do risco inflacionário - disse o líder do PSB, senador Renato Casagrande (ES).

Segundo Mantega, o texto do projeto de lei do fundo soberano será encaminhado em breve à Câmara. A decisão sobre os investimentos ficará a cargo de um conselho deliberativo.

Na reunião, chegou a ser sugerido que Mantega convocasse cadeia nacional de rádio e televisão para tranqüilizar a população. Mas a proposta não foi bem recebida.

O presidente em exercício, José Alencar, disse que o país corre o risco de retomar a indexação de preços e salários.

COLABORARAM Gerson Camarotti, Henrique Gomes Batista e Tatiana Farah