Título: Cheiro de podre
Autor: Doca, Geralda ; Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 29/06/2008, Economia, p. 33

BRASÍLIA. Apesar de manter voto favorável, como credor da Varig, às operações de salvamento judicial da empresa, o brigadeiro José Carlos Pereira, ex-presidente da Infraero, considera que pode ter sido "usado" no processo e diz que sempre sentiu um "cheiro podre" no ar.

Por que o senhor estava preocupado com a venda da VarigLog?

JOSÉ CARLOS PEREIRA: Havia um sentimento na Infraero de que alguma coisa não estava bem conduzida. Eu tinha esse sentimento.

Como assim?

J. CARLOS: Olfato. Cheiro de podre. As minhas referências foram as guerras nas audiências da recuperação judicial, das quais participei. O Roberto Teixeira, advogado da VarigLog, queria levar vantagem em tudo: "de preferência eu não pago, de preferência eu prorrogo". Ele é um homem truculento, avança, fala alto, grosso e Waleska (filha) mais ainda.

Como era o ambiente dessas audiências?

J. CARLOS: O clima era de hostilidade e guerra.

Pode dar algum exemplo?

J. CARLOS: Numa das audiências com o juiz Ayoub (Luiz Roberto Ayoub, da Vara Empresarial da Justiça do Rio encarregada da recuperação da Varig) alguém chamou o presidente do Tribunal de Justiça para apaziguar os ânimos. Recordo sobre o novo Cheta (Certificado de Empresa de Transporte Aéreo) da Varig. Ele defendia que esse Cheta tinha que sair imediatamente porque os pilotos continuavam os mesmos, apenas os aviões tinham mudado de dono. Foi uma discussão feroz.

Roberto Teixeira freqüentava a Infraero?

J. CARLOS: O Roberto Teixeira e a Waleska iam muito lá tratar de VarigLog. Estive com eles uma ou duas vezes para cumprimentar. O problema deles era com a procuradoria jurídica. Eu não dava confiança para eles.

O senhor afirmou que a aprovação da venda da VarigLog foi impatriótica?

J. CARLOS: Eu continuo achando isso. É ilegal e impatriótico. É violação da lei.

O senhor foi pressionado pela ministra Dilma Rousseff?

J. CARLOS: Dilma me ligou e me deu uma esculhambação. Ela disse que eu estava me metendo onde não devia.

A Infraero foi orientada pela Casa Civil?

J. CARLOS: A orientação da Casa Civil era fazer tudo para evitar a falência da Varig. Nas reuniões em que participei lá, sempre defendi que a empresa tinha que recuperar seus créditos.

Qual a razão do seu telefonema para a Anac, após a aprovação da operação?

J. CARLOS: Queria saber se a operação estava "ok" e reafirmar nossa posição de salvar a Varig, mas garantir o recebimento das dívidas. Perguntava: "Zuanazzi, esse negócio que vocês estão fazendo aí está legal, obedecido o Código Brasileiro de Aeronáutica?". Ouvi que estava tudo dentro da normalidade. (G. D. e L. S.)