Título: Descida sem freio
Autor: Rangel, Juliana; Novo, Aguinaldo
Fonte: O Globo, 03/07/2008, Economia, p. 23

AMEAÇA GLOBAL

Temor de falência da GM faz bolsas despencarem. No Brasil, queda foi de 3,61%.

O temor de falência da General Motors (GM), uma das maiores montadoras do mundo, os novos recordes do petróleo e a perspectiva de aumento dos juros, hoje, pelo Banco Central Europeu (BCE) formaram uma mistura explosiva que derrubou os mercados globais. O principal índice da Bolsa de Valores de Nova York, o Dow Jones, recuou 1,46%, para 11.216 pontos, o menor patamar desde 13 de março. O S&P caiu 1,82%, e o Nasdaq, 2,32%.

Na Europa e no Brasil não foi diferente. Londres, Paris e Frankfurt viram seus índices caírem 0,98%, 2,11% e 0,17%, respectivamente. Tóquio recuou 1,31%. No Brasil, o susto foi ainda pior: com medo de ficarem expostos a riscos com o mercado americano fechado - por causa do feriado da Independência, amanhã - investidores se retiraram em massa. O principal indicador da Bolsa, o Ibovespa, caiu 3,61%. Com isso, já acumula perda de 4,35% no ano. Sofreram mais os papéis com maior liquidez. As ações preferenciais (PN) da Petrobras recuaram 4,57%; as da Vale, 5,73%; e as da Gerdau, 7,10%. As ações ordinárias (ON) da CSN tiveram a maior queda do dia: 7,49%.

Já o dólar recuou 0,12%, a R$1,603. Segundo o gerente de câmbio do Banco Prosper, Jorge Knauer, a moeda caiu, apesar da fuga de investidores, porque voltou a se desvalorizar no mercado internacional.

Em Wall Street, o dia começou ruim em função da alta dos preços do petróleo, cuja cotação atingiu US$144, e do corte de 79 mil vagas no setor privado em junho, o maior número desde novembro de 2002.

O quadro piorou quando a Merrill Lynch divulgou relatório afirmando não descartar a falência da GM, devido à queda nas vendas nos EUA. Sua estimativa para o valor dos papéis da montadora despencou de US$28 para US$7. O documento caiu como uma bomba: as ações da GM recuaram 15%, para US$9,98, a menor cotação desde 13 de setembro de 1954. Foi a maior queda em um dia em 21 anos.

O relatório afirma que a "dramática queda" das vendas nos EUA vai continuar em 2009, forçando a GM a levantar US$15 bilhões: "A falência não é impossível se o mercado continuar a se deteriorar".

A porta-voz da montadora, Renée Rashid-Merem, não acalmou os ânimos ao dizer apenas que a empresa "tem liquidez suficiente e flexibilidade financeira para cumprir suas necessidades de financiamento para 2008".

Em junho, as vendas da GM nos EUA caíram 18%. Em um ano, suas ações acumulam queda de 74%, e seu valor de mercado recuou de US$21,5 bilhões para US$5,65 bilhões.

"Mercado de urso" chegou a Wall Street

Mais do que nunca, a GM depende hoje do seu resultado em mercados emergentes. Sem considerar seu braço financeiro (a GMAC), o lucro global da montadora foi de US$392 milhões no primeiro trimestre. A região formada por América Latina, África e Oriente Médio apresentou lucro recorde de US$517 milhões, mais que o dobro do registrado em igual período de 2007.

O Brasil representa 40% dos negócios dessa área. Segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), em junho a GM ultrapassou a Volks e ficou em segundo lugar no mercado interno, com 22,46% de participação, contra 22,19% da montadora alemã. A líder é a Fiat, com 26,38%.

Com uma desvalorização que já supera 20% em relação ao mais recente ciclo de altas, Dow Jones e Nasdaq já se encaixam na definição de bear market ("mercado de urso"). É um período de pessimismo, que contrasta com o bull market ("mercado de touro"), de valorização contínua.

Segundo o chefe de pesquisas da corretora Planner, Ricardo Tadeu Martins, o cenário ainda é nebuloso a curto prazo. Ele acredita que os investidores se anteciparam à decisão do BCE, lembrando que ninguém quer ficar exposto a "surpresas", já que as bolsas nos Estados Unidos hoje funcionarão apenas durante uma parte do dia e não abrirão amanhã.

- A aposta é de uma elevação da taxa básica de juros pelo BC europeu. O mercado pode ter se antecipado a essa decisão e à divulgação dos dados sobre desemprego nos Estados Unidos, que também será feita hoje - diz Martins, ressaltando que o investidor que já está na Bolsa não deve apressar sua saída por causa dessas quedas. - O mercado é para quem tem recursos disponíveis para poupança de longo prazo.

(*) Com Bloomberg News e agências internacionais

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