Título: Lei Seca alivia emergências
Autor: Bottari, Elenilce; Alves, Maria Elisa
Fonte: O Globo, 05/07/2008, Rio, p. 14

Número de atendimentos a acidentados em hospitais cai 17% no Rio e 19% em São Paulo.

Há apenas duas semanas em vigor, a Lei Seca já dá sinais de que poderá surtir um efeito no trânsito tão rápido quanto o álcool no reflexo dos motoristas. Um levantamento feito em quatro grandes emergências do Rio pela Secretaria estadual de Saúde, na segunda semana depois de a lei ter entrado em vigor, no dia 20 de junho, constatou que houve uma queda média de 17,3% no número de atendimentos a acidentados. Os registros caíram de 23 para 19 casos por dia. No resto do país, o fenômeno também ocorre. Em São Paulo, segundo a Secretaria de Saúde, o atendimento a vítimas de acidentes de trânsito caiu, em média, 19%. No Hospital das Clínicas, o maior da América Latina, a redução chegou a 27%.

Em Goiânia, no último fim de semana, o Hospital de Urgências (o mais importante do estado) registrou queda de 277 para 211 atendimentos.

Na madrugada de ontem, em Salvador, o motorista Joel Gomes Andrade, de 37 anos, que dirigia um Ford Fiesta na contramão, bateu num caminhão na Rodovia BR-324. Segundo policiais, ele estava embriagado. Joel está internado, em estado grave, com fraturas nas duas pernas e várias costelas quebradas. O motorista do caminhão saiu ileso.

Números devem cair ainda mais

Segundo o superintendente de Urgência e Emergência Pré-Hospitalar do Rio, coronel Fernando Suarez, na próxima segunda-feira, a Secretaria de Saúde deverá fechar as primeiras estatísticas oficiais, mas o efeito da nova lei já pode ser sentido nas emergências:

- A gente tem observado nos últimos dias uma queda. E acredito que os números devam cair ainda mais. Do total de acidentados atendidos em nossos hospitais, em 30% dos casos temos o hálito etílico presente. Se houvesse exames de alcoolemia, o índice seria muito maior - disse o coronel.

O Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) ainda não publicou resolução detalhando o texto da nova lei. Isso porque técnicos do Ministério da Saúde estão elaborando uma lista com medicamentos que contêm álcool em sua composição, para facilitar o trabalho dos agentes de trânsito. O Conselho Nacional de Trânsito, vinculado ao Denatran, também aguarda informações sobre a concentração de álcool no sangue de portadores de doenças crônicas, que têm um metabolismo diferente das pessoas sadias.

A lei vem causando polêmica e dividido juristas - alguns a consideram inconstitucional. O condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos é punido. Mas a Constituição Federal garante o direito do cidadão de não produzir provas contra si mesmo. O motorista flagrado alcoolizado recebe multa de R$955, tem seu veículo apreendido e pode perder a carteira. Além disso, fica sujeito a medidas penais e pode ser condenado à prisão, com pena de seis meses a três anos.

Na opinião do diretor jurídico do Detran, Rodrigo Ferreira, as duas leis não são antagônicas. Segundo ele, a produção de provas a que se refere a Constituição é em matéria penal. Já a obrigatoriedade de se submeter a exames prevista na nova lei de trânsito trata de procedimento administrativo. Para ele, um dos pontos mais importantes da lei é o fim da impunidade. Nos casos de acidentes de trânsito com vítimas provocados por embriaguez, excesso de velocidade ou pega, os condutores não terão mais direito a conciliação ou a transação penal:

- Nesses casos, o condutor não terá direito a uma transação penal, que lhe permita pagar cestas básicas. Ele responderá a uma ação penal.