Título: Financiamento ao largo da crise
Autor: Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 08/07/2008, Economia, p. 17

Mercado ainda é maior fonte de recursos para empresas, mas BNDES pode ganhar espaço.

Apesar da crise financeira mundial, o mercado de capitais se mantém como a principal fonte de financiamento para as empresas brasileiras. Segundo dados do Banco Central, dos R$140 bilhões que as empresas brasileiros conseguiram captar neste ano, até junho, R$55,8 bilhões foram levantados via emissões de ações, debêntures, notas promissórias e outros títulos. Esse valor representa 39,8% do que foi destinado ao setor privado entre recursos do mercado financeiro, captações externas e financiamento do BNDES. Os recursos liberados pelo banco, até maio, somaram R$32,3 bilhões, respondendo por 23,1% do total levantado por empresas brasileiras no ano.

Desde 2005, com a volta das ofertas públicas iniciais de ações, o mercado tem superado o BNDES como financiador de empresas. Até então, o banco estatal respondia por mais da metade dos recursos, seguido pelas captações no exterior. O mercado financeiro ficava na lanterninha. Em 2008, até maio, as captações externas totalizam R$52 bilhões, 37,1% do volume destinado às companhias brasileiras.

Mesmo o Banco do Brasil, outro importante financiador, não tem sido grande concorrente. No primeiro trimestre, a carteira de crédito do banco cresceu R$4,118 bilhões no agronegócio e R$1,712 bilhão nas demais empresas.

Emissão de ações é mais concentrada

Mas, em meio a um cenário de crise, a dúvida é quem vai ganhar essa corrida no financiamento de empresas em 2008. Se as incertezas quanto ao crescimento mundial - e a conseqüente aversão a risco pelos investidores - se mantiverem, o risco é o BNDES voltar a responder por uma fatia maior e até trazer de volta a dependência de empresas em relação à instituição.

- Se a crise se agravar, as empresas podem procurar fontes de recursos mais seguras (como o BNDES). Quando os juros caem, a vantagem do empréstimo barato (do banco de fomento) não fica tão evidente. Quando há tendência de os juros subirem, o BNDES pode voltar a ganhar espaço - diz André Segadilha, chefe de análise da Prosper Corretora.

Segundo ele, os bancos privados estão montando áreas para oferecerem financiamentos com melhores condições do que o governo. O BNDES trabalha com a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), em 6,25% ao ano, enquanto a taxa básica de juros, Selic, está em 12,25% e os bancos privados cobram bem mais do que isso.

Um analista lembra que os números do mercado neste ano estão distorcidos por poucas grandes operações, com destaque para os R$6,712 bilhões captados pela OGX, do empresário Eike Batista. Ele avalia que, no número de empresas atendidas, o BNDES já deve superar o mercado, pois atende a companhias menores.

Outra empresa que deve engordar os números do segmento é a Vale, que tem uma oferta de R$21 bilhões (US$12,5 bilhões) em ações em curso. Patricia Branco, sócia da gestora de recursos Global Equity, avalia que mesmo a mineradora já diminuiu o tamanho de sua operação, antes estimada em US$15 bilhões.

O economista-chefe da Ágora, Álvaro Bandeira, lembra que a nota de grau de investimento dada por duas agências de risco ao Brasil aumenta as chances de o BNDES ser substituído de vez pelo mercado, embora o banco pretenda desembolsar R$83 bilhões este ano. No ano passado, foram 76 ofertas públicas de ações na Bolsa. Neste ano, foram 11 até junho.

Ontem, em dia de extrema volatilidade, o principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), o Ibovespa, chegou a subir 2,41% e passar de 60 mil pontos, com a queda do preço do petróleo, mas encerrou em queda de 0,47%, aos 59.088 pontos. O dólar comercial caiu 0,44%, para R$1,601. Ajudou a azedar o humor dos investidores uma análise do banco Lehman Brothers de que as agências de crédito imobiliário estatais americanas Fannie Mae e Freddie Mac precisarão se capitalizar em mais US$46 bilhões e US$29 bilhões, respectivamente, caso seja aprovada uma mudança na legislação.