Título: Biocombustível de grãos vira alvo de críticas em reunião dos mais ricos
Autor: Scofeild Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 08/07/2008, Economia, p. 18

Segundo jornal britânico, estudo do Banco Mundial revelaria efeito em preços.

RUSUTSU, Japão. Num dia que deveria ser marcado por discussões sobre como o G-8 - grupo formado pelos países mais ricos do mundo (EUA, Japão, Alemanha, Canadá, França, Itália e Reino Unido) mais a Rússia - poderia aumentar a ajuda financeira a África, reduzindo a pobreza no continente, os biocombustíveis roubaram a cena no recorrente papel de grande vilão da alta nos preços dos alimentos no mundo.

Reportagem publicada na sexta-feira pelo jornal britânico "The Guardian" - e que circulava ontem de mão em mão no Centro Internacional de Imprensa em Hokkaido - traz um estudo sigiloso do Banco Mundial (Bird) afirmando que a produção de biocombustíveis a partir de milho e sementes oleaginosas, como fazem EUA e União Européia, forçou uma alta de 75% nos preços dos alimentos nos últimos seis anos. O estudo destacaria ainda que a produção de etanol a partir de cana-de-açúcar, tecnologia largamente dominada pelo Brasil, não teve tanto impacto.

A reportagem foi citada ontem, primeiro dia do encontro do G-8, em seminários e exposições de nove entre dez organizações não-governamentais presentes à reunião. Especialmente porque o estudo desarma a argumentação dos EUA de que a fabricação de biocombustíveis foi responsável por um impacto de menos de 3% nos preços dos alimentos.

Zoellick defende redução de subsídios de países ricos

O presidente do Bird, Robert Zoellick, não confirmou a existência do estudo em coletiva de imprensa dada ontem juntamente com o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon. Mas assegurou que os biocombustíveis a partir de milho e oleaginosas contribuíram para a alta dos preços dos alimentos e sugeriu que EUA e União Européia invistam mais recursos no desenvolvimento de fontes de energia que não utilizem grãos consumidos em larga escala.

- Acredito que seja preciso mais pesquisa científica para que possamos saber com clareza o impacto exato da produção de biocombustíveis nos preços dos alimentos - disse Zoellick, que pediu o fim dos subsídios dados ao produto nos países ricos. - Os países do G-8 precisam conjugar uma política que reduza os subsídios dados à produção de etanol com uma redução tarifária que permita a compra de combustíveis mais limpos. E afinal, se os preços do milho já estão altos, em tese os subsídios já não são necessários.

Muitos entenderam isso como uma abertura para a reivindicação brasileira de mais mercado para o etanol de cana-de-açúcar, hoje praticamente expulso dos mercados europeus e americanos por conta de pesada tarifação. O secretário-geral da ONU chegou a citar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva:

- Temos que estimular a produção da chamada segunda geração de biocombustíveis, que utilizam alimentos não consumidos em larga escala. O presidente do Brasil, Lula, inclusive, está convocando os países para uma conferência internacional sobre o etanol brasileiro em novembro.

Para Max Lawson, consultor político da ONG inglesa Oxfam, a dificuldade dos países ricos em acabar com a produção de biocombustíveis à base de alimentos está na ligação desses governos com a indústria petrolífera e no poderoso lobby dos produtores agrícolas europeus, japoneses e americanos junto a seus parlamentos:

- A falta de apoio ao etanol brasileiro, bem menos prejudicial ao mercado de alimentos, é protecionismo puro.

Mas Julie Wilson, do Grupo de Pesquisa do G-8 do Centro Munk de Estudos Internacionais da Universidade de Toronto, no Canadá, afirmou que os biocombustíveis são um ponto de divergência entre os países ricos, que têm posições tão díspares quanto a defesa do fim de sua produção - caso do Reino Unido -, o estabelecimento de limites para o uso de alimentos na produção do etanol - caso da União Européia - até a concessão de mais subsídios e estímulos à produção - caso dos EUA.