Título: Pela segunda vez, Gilmar livra Dantas
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 12/07/2008, Economia, p. 24

Ao mandar soltar o banqueiro, presidente do STF acusa juiz federal de São Paulo de desrespeitar o Supremo

Carolina Brígido

BRASÍLIA. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, concedeu ontem liminar, pela segunda vez em dois dias, garantindo liberdade ao banqueiro Daniel Dantas, investigado pela Operação Satiagraha. Não bastasse a decisão polêmica, em sua justificativa Gilmar deflagrou uma guerra, ao afirmar que encarcerar novamente o dono do Opportunity foi uma afronta do juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Federal de São Paulo, à Corte máxima do país.

Dantas teve prisão temporária decretada na terça-feira por de Sanctis. Na quarta-feira à noite, Gilmar mandou soltar o banqueiro. No dia seguinte, Sanctis determinou a prisão preventiva. Ontem, em despacho de 11 páginas, o presidente do STF reclamou da insurgência do magistrado e ordenou a libertação de Dantas - cuja segunda temporada no xadrez durou menos de 15 horas.

"Ressalte-se que o novo encarceramento do paciente (Dantas) revela nítida via oblíqua de desrespeitar a decisão deste Supremo Tribunal Federal", escreveu Gilmar.

Gilmar: ordem de prisão carece de fundamentação

O presidente do STF lembrou que, em outra ocasião, Sanctis entrara em conflito com uma decisão de outro integrante do Supremo, Celso de Mello: "Portanto, não é a primeira vez que o juiz federal titular da 6ª Vara Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo, Dr. Fausto Martin de Sanctis, insurge-se contra decisão emanada desta Corte".

Segundo De Sanctis, o banqueiro deveria permanecer atrás das grades para ser interrogado e para não prejudicar o andamento das investigações. Ao conceder o novo habeas corpus, Gilmar usou os mesmos argumentos do primeiro despacho sobre a situação de Dantas.

O presidente do STF esclareceu que lei alguma prevê prisão para garantir o depoimento do investigado. E alegou que, neste momento, a fase de compilação das provas já se encerrou. Por isso, o banqueiro não poderia mais atrapalhar a atividade da polícia.

"Assim como afirmado na decisão que deferiu a suspensão da prisão temporária, mais uma vez a fundamentação utilizada pelo juiz não é suficiente para justificar a restrição de liberdade do paciente", sustentou Gilmar. "No entendimento do magistrado, a prisão preventiva teria como base a possibilidade de interferir o investigado na colheita de provas outras que apenas supõe possam existir, a configurar rematado absurdo, inaceitável em se tratando de tão grave medida restritiva do direito de ir e vir".

Gilmar também alegou que a tentativa de subornar delegados da Polícia Federal por Hugo Chicaroni e Humberto Braz não pode ser encarada como um fato novo para justificar outro pedido de prisão. O ministro disse que De Sanctis já sabia desses episódios antes de decretar as prisões temporárias, no início da semana. Após divulgar o despacho, Gilmar não quis dar entrevista para comentar a guerra declarada ao juiz paulista.

Dantas recorreu ao STF às 10h45m. Gilmar recebeu a ação no início da tarde e, às 17h30m, o despacho determinando a liberdade do banqueiro já estava pronto. A petição de Dantas foi assinada por seis dos advogados mais renomados do país: Nélio Machado, Pedro Gordilho, Fernando Neves, Luiz Carlos Madeira, Alberto Pavie Ribeiro e Henrique Neves. Eles argumentaram que o novo pedido de prisão contra Dantas foi um ato orquestrado da 6ª Vara com a Polícia Federal e o Ministério Público.