Título: Doleiros, o novo alvo
Autor: Soraya, Aggege
Fonte: O Globo, 13/07/2008, Economia, p. 31

PF e Procuradoria cruzarão dados com caso Banestado para desvendar esquema do Opportunity.

Oinistério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF) vão abrir um novo leque de investigações da Operação Satiagraha, focado no chamado nicho dos doleiros, freqüentes personagens nos grandes esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro. A primeira medida será o cruzamento de dados da Operação Satiagraha com o banco de dados do caso Banestado, investigado pelo MPF do Paraná desde 1997 e que resultou na CPI do Banestado, entre 2003 e 2004. O alvo é o caminho do dinheiro que teria sido lavado no exterior pelo Opportunity Fund, do banqueiro Daniel Dantas.

- Por meio desses cruzamentos, vamos analisar as possíveis relações dos doleiros, inclusive com o HD (disco rígido) do Opportunity. Pela dimensão das provas obtidas até agora, a perspectiva é que esse ramo de investigações no grupo dos doleiros cresça demais - disse um dos responsáveis pela apuração.

"Laranja" remeteria dinheiro ao exterior

O MPF do Paraná informou ao GLOBO que pelo menos dois dos doleiros investigados na Satiagraha aparecem nos bancos do caso Banestado: Lúcio Bolonha Funaro - que também esteve envolvido no mensalão - e Marco Ernest Matalon, conhecido como "o doleiro das estrelas", porque operaria para brasileiros famosos. Ambos teriam movimentado contas no MTB Bank de Nova York.

Figurinhas carimbadas na maioria dos crimes financeiros, é comum que os chamados doleiros, embora atuem separadamente, operem empresas de fachada ou nas chamadas empresas-conchas (por oferecerem uma capa de licitude aos esquemas de lavagem de dinheiro). Até agora, os doleiros envolvidos na Satiagraha foram denunciados apenas pelo suposto envolvimento com o investidor Naji Nahas. Eles fariam o esquema de dólar-cabo, que é ilegal, para proporcionar dinheiro vivo a envolvidos em esquemas de corrupção, segundo a denúncia do MPF.

No entanto, a PF suspeita que, dentro do esquema do Opportunity, o dinheiro obtido de forma ilícita seria enviado por brasileiros ao exterior, por meio de doleiros e de empresas em nomes de "laranjas". Pelo Opportunity Fund, uma offshore, o dinheiro retornaria ao Brasil sob a forma de investimentos estrangeiros no país, com chancela legal, mas sem pagamento de Imposto de Renda. O suposto esquema aparece em trocas de e-mails interceptados pela Inteligência da PF.

As operações do banqueiro envolveriam mais de 160 empresas de prateleira que agiriam em "esquema de mútuo", segundo as investigações da Satiagraha.

- Creio que nem o próprio Dantas saiba de fato quantas empresas são. Identificamos mais de 160, mas podem chegar a centenas - disse um dos responsáveis pela investigação.

Com os dados do disco rígido do Opportunity apreendido na Operação Chacal, em 2004, onde haveria indícios das operações com doleiros, MPF e PF esperam cruzar informações com o caso Banestado e ainda com o material apreendido na Satiagraha na semana passada.

Além de ter sido identificado no caso Banestado como um dos operadores das contas CC-5 - que servem para que empresas multinacionais ou brasileiras com interesses no exterior transfiram dinheiro para fora do país, também utilizadas para o envio de dinheiro a brasileiros que moram no exterior -, o economista Funaro é apontado como o principal elo entre o mensalão e os supostos esquemas de Daniel Dantas e Naji Nahas.

Funaro, identificado nas gravações da PF como "Maluquinho", teria firmado acordo de delação premiada no inquérito do mensalão. Em sua decisão que resultou na prisão provisória dos envolvidos - liberados em seguida por habeas corpus do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes -, o juiz federal Fausto de Sanctis frisou que, se confirmada a reincidência de Funaro, o caso dele se tornará ainda "mais grave".

Funaro fundou a Guaranhuns Empreendimentos e Participações S/C Ltda. Foi por meio da Guaranhuns, segundo a CPI dos Correios, que Marcos Valério teria repassado R$6,5 milhões para o ex-deputado federal Valdemar Costa Neto (PL), que renunciou para evitar a cassação. Além de operar com fundos de pensão, Funaro teria recebido depósitos da empresa Natimar, supostamente de fachada, para repassar recursos de Valério para a corretora Bônus-Banval, envolvida no mensalão.

Políticos e artistas entre beneficiados

Agora, na Operação Satiagraha, constatou-se que a empresa RS Administração e Construção Ltda. - de fachada, segundo o MPF - estaria sediada no escritório de Nahas, em São Paulo.

Outro doleiro que tem conexões a serem investigadas é Matalon, "o Velho", apontado como um dos maiores do ramo no Brasil. No caso Banestado, ele chegou a ser denunciado pelo MPF do Paraná, mas não houve condenação por parte da Justiça.

Pelo Merchants Bank de Nova York, ele teria operado entre 1998 e 2002 por meio da conta Bradner Finantial. Entre os beneficiados, estariam políticos, artistas e jogadores de futebol. Pelas contas do Merchants, circularam US$18 bilhões à época. Quase todos os fundos offshore que operavam no esquema Banestado-MTB também estavam no Merchants.

- Por meio de todos esses cruzamentos das operações dos doleiros, com dados que vão de 1996 a 2008, poderemos concluir checagens de nomes importantes que teriam sido beneficiados pelo esquema de Dantas - afirmou um dos investigadores do caso.