Título: Planalto unifica discurso para blindar governo
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 15/07/2008, Economia, p. 24
LIGAÇÕES PERIGOSAS: Conversa telefônica gravada na Operação Satiagraha envolve chefe de gabinete de Lula.
Integrantes da coordenação política decidem minimizar importância de diálogo entre Carvalho e Greenhalgh.
BRASÍLIA. Para blindar o Palácio do Planalto e evitar qualquer tipo de seqüela da Operação Satiagraha para o governo e seus integrantes, o núcleo de coordenação política colocou em prática um discurso único para minimizar os impactos da investigação da Polícia Federal (PF). Apesar do desconforto com o grampo judicial que flagrou uma conversa telefônica em que o ex-deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh pede ao chefe de gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, para checar se a Abin investigava o ex-dirigente da Brasil Telecom Humberto Braz, a ordem ontem foi demonstrar tranqüilidade e reduzir a importância do episódio.
Na reunião de coordenação política comandada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilberto Carvalho chegou a ler para ministros a nota em que confirmou que, no último dia 28 de maio, foi procurado por Greenhalgh para saber sobre a investigação. Nas palavras de um ministro que participou da reunião, houve consenso de que foi uma conversa normal "entre dois amigos de longa data", sem que a conduta de Carvalho tenha sido comprometida.
Esse discurso começou a ser costurado ainda no domingo, quando Lula chegou de viagem. Ele recebeu na residência oficial, o Palácio da Alvorada, o ministro Franklin Martins (da Secretaria de Comunicação).
Lula condena uso de algemas na ação da PF
Porém, fora do núcleo duro de governo, avalia-se que o ideal teria sido que o chefe de gabinete - amigo de Lula - não tivesse dado prosseguimento ao pedido de Greenhalgh. Ainda assim, a expectativa no Planalto é que esse assunto saia rapidamente do noticiário.
Durante cerca de duas horas, coube ao ministro da Justiça, Tarso Genro, fazer uma exposição detalhada da operação da PF que culminou com a prisão do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. Foi a primeira reunião de avaliação política do quadro com a participação do presidente, desde que a operação foi deflagrada. Na semana passada, Lula estava fora do Brasil, em viagem a países da Ásia.
Apesar do incômodo do presidente Lula com a proximidade de Dantas com integrantes do governo e do PT, a ordem no Planalto foi dar um tom de normalidade nessas relações. Como revelou ontem O GLOBO, antes mesmo de a operação Satiagraha ser deflagrada, Lula nunca escondeu sua preocupação com os tentáculos de Dantas nas esferas de seu governo.
Segundo relatos da reunião, ficou caracterizado que seria praticamente impossível que Gilberto Carvalho não atendesse a uma ligação de um amigo, no caso Greenhalgh, e que isso é um fato comum no Planalto. Para evitar desmentidos e constrangimentos, emissários do governo chegaram a consultar nos últimos dias o ex-deputado petista, para que não surgissem versões desencontradas. Coincidentemente, Greenhalgh deixou de falar sobre o tema com interlocutores.
Fora da reunião de coordenação política, assessores do governo avaliaram ainda a citação nas investigações da PF da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ex-ministro José Dirceu. O consenso no governo é que o contexto das gravações em que os dois são citados não causa constrangimento ao governo, pois não revela qualquer ação em favor de Dantas.
Apesar de aprovar a operação, o presidente condenou o uso de algemas na prisão dos envolvidos:
- Se não oferece resistência, por que algemas? Para que humilhar a pessoa antes de estabelecer que ela é culpada? Não havia culpabilidade comprovada - disse Lula.