Título: Pressionado, Senado desiste de criar cargos
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 16/07/2008, O País, p. 9

Mesa Diretora, temendo desgaste maior, nem chegou a se reunir: informalmente comunicou recuo ao presidente da Casa.

BRASÍLIA. Depois das críticas, o Senado recuou ontem e desistiu de criar mais 97 cargos de confiança, que teriam salário bruto de R$9.970,24 e um impacto de mais de R$12 milhões por ano nas contas públicas. Para evitar um desgaste maior ainda, a Mesa Diretora nem chegou a se reunir. Seus integrantes preferiram comunicar informalmente ao presidente da Casa, Garibaldi Alves (PMDB-RN), que tinham desistido da medida.

Os senadores evitaram se expor num debate polêmico em plenário, e, da mesma forma que criaram os cargos, sem alarde, desistiram. Coube a Garibaldi anunciar oficialmente a decisão. Ele admitiu que a repercussão negativa da sociedade influenciou os senadores.

Garibaldi divulgou nota informando que, após consultar os demais integrantes da Mesa, resolveu arquivar a proposta: "Os senadores ouvidos foram unânimes em opinar pelo não envio da proposição para análise do plenário da Casa".

- A repercussão foi negativa, ninguém pode negar, tapar o sol com a peneira. E entendeu a Mesa de cancelar. Quem sai fortalecido é o Senado, que soube reconhecer, através da sua Mesa, que a medida não era oportuna - disse Garibaldi. - É importante sempre estar em sintonia com a população.

Diante da posição contrária de Garibaldi, manifestada desde a semana passada, os próprios integrantes da Mesa - 14 senadores, entre titulares e suplentes - chegaram ontem a Brasília articulando o recuo. Eles acertaram, por telefone, que não seria necessário nem realizar a reunião convocada por Garibaldi para a tarde.

Integrante da Mesa, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) contou que recebeu telefonema do colega César Borges (PTB-BA) propondo o recuo e o cancelamento da reunião. Dias, que já era contra a idéia, disse que assim se evitou um desgaste maior.

Para justificar a nova posição, o entendimento foi de que a Mesa não havia decidido formalmente a questão, já que não houve votação ou ata sobre o assunto, o que permitiu a eles simplesmente desistir. Para manter a criação dos cargos, Garibaldi exigia que a proposta fosse analisada pelo plenário do Senado por meio de projeto de resolução.

Apesar de todos os líderes partidários terem assinado, em abril, a proposta de criação dos cargos, o senador Efraim Morais (DEM-PB) acabou ficando sozinho na defesa da proposta. Diplomático, o presidente do Senado evitou criticar os colegas.

- Também não acho que a posição deles seja tão equivocada, que eles estejam tão na contramão. Não quero criar esse tipo de polêmica dentro de uma Mesa que eu presido.

Num Senado quase vazio às vésperas do recesso que começa amanhã, parte dos parlamentares fez autocrítica. Alguns, como o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), classificaram o episódio de "trapalhada".

- A impressão que eu tenho é que isso foi uma grande trapalhada, deplorável trapalhada, que só compromete a instituição e os senadores. Tem que haver convicção: se é para criar cargo, que tenha razão e fundamento e defenda isso o tempo todo; se não é para criar cargo, que não o crie. O que não pode é criar hoje e deixar de criar amanhã, sem explicação nem para um gesto, nem para o outro - disse Sérgio Guerra.

- Não tem porque ter medo, ficar (tratando do assunto) pelos corredores. Se errar, admite (publicamente) - afirmou o vice-presidente do Senado e integrante da Mesa, Tião Viana (PT-AC).

Garibaldi Alves confirmou que será realizado em setembro concurso para abrir 150 vagas de técnico legislativo no Senado. Segundo a diretoria geral da Casa, o número de servidores concursados caiu, nos últimos anos, de 3.500 para cerca de dois mil.

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