Título: STJ garante a Cacciola direito de ficar sem algema
Autor: Tavares, Mônica; Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 17/07/2008, Economia, p. 25

LIGAÇÕES PERIGOSAS: Tarso Genro afirma que extradição é sinal de que "impunidade está terminando" no Brasil.

Justiça também autoriza acesso reservado a advogado, mas indefere pedido de proibição de fotos do ex-banqueiro.

BRASÍLIA, PARIS e RIO. O ex-banqueiro Salvatore Cacciola foi autorizado a desembarcar hoje no Brasil sem algemas. Sua chegada está prevista para as 5h. O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Gomes de Barros, concedeu habeas corpus a Cacciola por entender que um cidadão com 64 anos não pode oferecer resistência aos policiais federais. Ele se baseou em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em outra decisão, o ministro permitiu que o advogado do ex-banqueiro no Brasil, Carlos Ely Eluf, comunique-se pessoal e reservadamente com Cacciola logo que ele desembarque. Mas não aceitou o pedido da defesa do ex-banqueiro para que fossem proibidas fotos do seu cliente na chegada ao Aeroporto Tom Jobim. A decisão foi comunicada ao ministro da Justiça, Tarso Genro, e à direção-geral da Polícia Federal (PF).

Pedido de espera em liberdade será jugado

Entre os argumentos do advogado no pedido de habeas corpus para que Cacciola não fosse algemado, ele citou a Operação Satiagraha - que sofreu críticas de "espetacularização" por permitir a gravação das prisões, por exemplo, do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta. O objetivo de Eluf era evitar que o ex-banqueiro fosse fotografado e que sua intimidade fosse preservada.

Um outro habeas corpus, impetrado pela defesa do ex-banqueiro para que ele aguardasse o julgamento em liberdade - descontando o tempo em que ficou preso em Mônaco (dez meses) - ainda não foi julgado. Por ser mais complexo, o ministro Gomes de Barros solicitou informações adicionais ao Ministério da Justiça e ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Além disso, ele solicitou o parecer do Ministério Público Federal (MPF). Somente depois será apreciado o pedido de liminar ou o próprio mérito do habeas corpus.

Segundo Eluf, o tempo da prisão temporária usual, de 81 dias segundo a jurisprudência, já teria sido extrapolado. Isso porque o caso ainda não teve decisão definitiva e deve ser julgado novamente pelo Tribunal Regional Federal (TRF).

O Ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou que o retorno de Cacciola ao Brasil é um marco para o país.

- Para nós interessa muito pouco quem é ele, quais são as suas relações políticas. O seu Cacciola está voltando porque ele é um condenado pela Justiça brasileira. Isso tem símbolo muito grande, interno e externo. O interno é que a Justiça pode demorar um pouco, mas não falha, ela pode não falhar. Significa que a impunidade está terminando. O segundo é a relação do Brasil com a comunidade internacional, o Brasil teve confiabilidade internacional - disse.

Tarso afirmou ainda que já existe a orientação de não expor desnecessariamente nenhum preso.

- Se o STJ determinar que ele não seja algemado, logicamente o agente vai cumprir essa decisão, nós não discutimos decisão judicial. Isso não é um risco, isso é uma virtude da democracia.

Em Mônaco, pouco tempo antes de deixar a Maison D"Arrêt (casa de detenção), Cacciola recebeu visita de seu advogado Frank Michel. A surpresa de última hora ficou por conta da aparição de uma misteriosa loura italiana na porta da prisão, que tentou, em vão entregar uma carta ao ex-banqueiro. Por volta das 8h (hora de Brasília), Cacciola foi entregue às autoridades brasileiras, oito anos depois de fugir do país.

Com uma aparência bem diferente dos tempos do Banco Marka - trajava calça jeans, camisa pólo branca, tênis, óculos escuros e tinha os cabelos compridos -, Cacciola, que chega hoje de manhã ao Rio de Janeiro, no vôo JJ8055, da TAM, com procedência de Paris, mostrava-se descontraído e em alguns momentos sorriu em conversas com os três agentes da PF que o escoltavam.

Após desembarcar, Cacciola vai para prédio da PF

Ele foi levado de helicóptero de Mônaco para Nice (França), cidade mais próxima com um aeroporto. Embarcou num vôo da Air France para a capital francesa e, por volta das 18h de Brasília, pegou o avião para o Brasil.

Após desembarcar no Rio, Cacciola deverá ir para o prédio da PF na Praça Mauá, para depois seguir para o Presídio Petrolino de Oliveira, em Bangu, usado para abrigar os presos condenados pela Justiça Federal. Ele seria ouvido pela desembargadora Marcia Helena Nunes, da primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Ela atua na apelação (contra sua condenação em primeira instância) impetrada pelos advogados do ex-banqueiro. Ontem, o TRF informou que a desembargadora desistiu de ouvi-lo.

(*) Enviado especial (colaboraram Felipe Frisch e Antônio Werneck)

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