Título: Cacciola foi transferido sem determinação judicial
Autor: Araújo, Vera; Ribeiro, Erica
Fonte: O Globo, 19/07/2008, Economia, p. 29

LIGAÇÕES PERIGOSAS: Saída do presídio de Ary Franco, onde haveria risco de rebelião, tem versões polêmicas.

Promotor estadual pediu que ex-banqueiro ficasse em cela individual, porque temia por sua integridade física.

A transferência do ex-banqueiro Salvatore Cacciola do presídio Ary Franco, em Água Santa, para Bangu 8, ocorreu anteontem à noite, sem determinação judicial, por decisão do secretário de Administração Penitenciária do Estado do Rio, coronel Cesar Rubens Monteiro de Carvalho. Segundo o coronel, às 22h30, o promotor estadual Fabiano Rangel, que atende à Vara de Execuções Penais (VEP), ligou pedindo que Cacciola ficasse numa cela individual, porque temia por sua integridade física e não queria que se repetissem incidentes ocorridos com outros presos.

- O promotor alegou que estava preocupado com ele (Cacciola) dividindo cela com presos comuns. Expliquei que ele estava numa cela destinada a presos da Polícia Federal, com Fernando de Miranda Iggnácio e Rogério Andrade (contraventores presos na Operação Gladiador da Polícia Federal). Como não tinha condições de pô-lo numa cela especial, determinei que ele fosse para Bangu, pois era direito dele por ter curso superior e ser um local seguro - disse o secretário, afirmando que a Seap não distingue presos por poder econômico. - Confesso que não entendi. Não me lembro de incidentes. Como secretário, se tiver que responder por alguma atitude, tentei agir da melhor forma.

As versões e as opiniões sobre a transferência de Cacciola são bastante desencontradas. Segundo o Ministério Público Estadual do Rio (MP), a Seap informou que a transferência aconteceu para evitar que uma rebelião, que seria "ameaça concreta" - de acordo com uma fonte, por ter havido regalias -, fosse desencadeada no presídio. Já o titular da Seap garantiu que não houve qualquer indício de rebelião em Água Santa.

Segundo o Tribunal de Justiça do Rio, o juiz Rafael Estrela Nóbrega, da Vara de Execuções Penais (VEP) - que é da esfera estadual -, não reconhece a transferência e só ficou sabendo depois que ela foi efetuada. Em nota, o juiz diz que enviou ofício ao secretário, informando que não recebeu manifestação do MP sobre a transferência de Cacciola, de Iggnácio e de Andrade (os dois últimos continuam no Ary Franco). Nóbrega também afirma que não tem conhecimento de documento sobre o curso superior de Cacciola. O advogado Alan Bousso disse que o diploma foi apresentado.

A assessoria da Seap disse que, apesar de a transferência ser feita normalmente com despacho da VEP, diante do risco relatado e do fato de o coronel ser um secretário, ele tem a competência para tal.

O Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região (Rio e Espírito Santo) informou que, para haver transferência de presos federais entre presídios, é necessário provocar a vara de execução, papel exercido, no caso, pela 9ª Vara Federal Criminal - ligada à Justiça Federal. Mas o TRF informou também que nenhum pedido de transferência havia passado pelo setor. Para o criminalista Virgílio Donnici, a decisão sobre a transferência tem de ser tomada pelo juiz do caso, que está em esfera federal.

O procurador regional da República no Rio, Artur Gueiros, responsável pela acusação no caso, lembra que o Rio não tem presídio federal, o que causa esse tipo de confusão.

Bousso e Carlos Eluf, também advogado de Cacciola, chegaram a dizer que a transferência fora autorizada pela Secretaria de Segurança Pública do Rio e pela Polícia Federal. Mas outro advogado esclareceu que houve confusão com os cargos, porque os dois não são do Rio.