Título: Vice já sofre retaliação por contrariar Cristina
Autor: Figueiredo , Janaína
Fonte: O Globo, 21/07/2008, O Mundo, p. 23

BUENOS AIRES. Embora o vice-presidente argentino, Julio Cobos, tenha assegurado dezenas de vezes que não está em seus planos abandonar o governo Cristina Kirchner, dois de seus principais colaboradores apresentaram sua demissão após a derrota da Casa Rosada no Senado, quinta-feira passada, provocada pelo voto negativo de Cobos. Segundo informações publicadas ontem pelo jornal "Clarín", os dois ex-funcionários próximos ao vice-presidente, que também é presidente do Senado, abandonaram seus cargos por pressão do ministro do Planejamento, Julio De Vido, homem do círculo íntimo de Néstor e Cristina Kirchner.

As primeiras vítimas da crise entre Cobos e o casal presidencial são o subsecretário de Combustíveis, Alejandro Rodríguez, e o diretor de Refinaria e Comercialização de Combustíveis, Eduardo Moreno. Ambos integravam a equipe de De Vido, um dos ministros mais poderosos do Gabinete de Cristina, herança deixada por seu marido e antecessor.

Cristina estaria estudando reforma ministerial

Ontem, o vice-presidente, que quinta-feira passada provocou a maior derrota do casal Kirchner em cinco anos, optou pelo silêncio. Já o ex-vice-presidente e governador da província de Buenos Aires, Daniel Scioli, pediu uma autocrítica ao governo.

- O mundo está observando nossa capacidade para superar esta situação - disse Scioli, importante aliado do casal K.

Cobos votou contra um projeto enviado pela presidente sobre a modificação do sistema que taxa as exportações de grãos, as chamadas retenções. A medida, aprovada em março passado por decreto, provocou uma onda de protestos em todo o país, convocada pelos produtores rurais, que consideraram inadmissível a implementação de um decreto que, na prática, elevava de 35% para mais de 40% os tributos cobrados aos exportadores de soja e girassol. Depois de três meses de manifestações em todo o país, Cristina enviou o polêmico decreto ao Congresso, sem jamais imaginar que sua estratégia fracassaria no Senado, onde o governo tinha maioria. Após uma apertada vitória na Câmara, a votação no Senado terminou em empate e o vice-presidente foi o encarregado de desempatar.

Com o peronismo rachado, a presidente, que passou o fim de semana na província de Santa Cruz, terra natal de Kirchner, estaria analisando a possibilidade de realizar uma reforma ministerial e lançar uma série de medidas econômicas, para tentar melhorar a desgastada imagem de seu governo (pesquisas recentes indicam que a popularidade de Cristina é de apenas 20%). Dentro do Partido Justicialista, o casal Kirchner deverá enfrentar o poder do ex-presidente Eduardo Duhalde (2002-2003), que, segundo versões extra-oficiais, já estaria armando um movimento antikirchner para enfrentar a hegemonia presidencial nas eleições legislativas de 2009.