Título: O nó da Saúde está na emergência dos hospitais :: José Gomes Temporão
Autor: Temporão , José Gomes
Fonte: O Globo, 23/07/2008, Opinião, p. 7

O Sistema Único de Saúde (SUS), ao longo de seus 20 anos, tornou-se uma grande rede interligada de serviços. Nesse período, o Brasil passou de um sistema que, até 1988, garantia o acesso à saúde pública apenas aos trabalhadores filiados à Previdência - 30 milhões de pessoas - para o Sistema Único de Saúde, que atende 190 milhões de pessoas, sendo que, em 80% dos casos, a dependência da rede pública é total. Apesar de todo o avanço, os desafios permanecem enormes e o Ministério da Saúde tem como prioridade atacar as suas deficiências de gestão e de estrutura.

Um dos pontos de estrangulamento é o atendimento de urgência e emergência de hospitais do país. Ocorre que 80% dos problemas de saúde podem ser solucionados na atenção básica. Por isso, em uma ação de prevenção e promoção à saúde, o Programa Saúde da Família vem provocando uma silenciosa revolução. O financiamento do programa foi triplicado entre 2002 e 2008, passando de R$1,3 bilhão para R$4,4 bilhões. A cobertura atinge hoje 90 milhões de pessoas. Estudos mostram que, onde o PSF se estrutura, diminuem as internações, aumenta a cobertura vacinal e ampliam-se as consultas pré-natal.

Mas o Ministério da Saúde sabe que isso não é suficiente. É necessário ter unidades não-hospitalares que possam prestar atendimento às urgências e às pequenas emergências. O Rio de Janeiro tem recebido apoio para implementar as Unidades de Pronto Atendimento, uma idéia que será expandida ainda este ano para o restante do país. São unidades dotadas de leitos de observação, que recebem pacientes que precisam de pronto-socorro. As UPAs trabalham integradas ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. Em um ano de existência, no Rio, 99,7% dos atendimentos foram solucionados nas próprias UPAs. Mas quando a transferência é necessária, o Samu é acionado, encaminhando o resgate e verificando para onde o paciente será alocado. O Samu abrange atualmente 101 milhões de pessoas em todo o Brasil.

Ainda assim, o sistema não se resolve sem preencher os vazios assistenciais. No ano passado, por exemplo, foi inaugurado o primeiro centro de oncologia do Acre. Antes, as pessoas da região tinham que viajar para o Sudeste a fim de garantir o atendimento. O ministério também sabe que é preciso investir nas pessoas. Neste ano, estão sendo oferecidos cursos para 23 mil profissionais do Samu. Além disso, em 2007, foi criada uma comissão que permite aos gestores do SUS dar as diretrizes dos cursos de graduação e residência das áreas de saúde para atender à necessidade da população. Foram disponibilizados R$80 milhões para as universidades apresentarem projetos de adequação em seus cursos e para bolsas de pesquisa.

As fragilidades do atendimento estão sendo combatidas ainda com o fortalecimento da produção nacional na área de saúde. Somente neste ano foram assinados dois acordos de transferência de tecnologia para a Fiocruz, um para a vacina de rotavírus e outro de medicamento para hepatite C. Uma portaria agora permite ao ministério fazer compras que favoreçam o produtor nacional. Outra estabelece quais áreas são de interesse do governo, que, junto com um pacote de financiamento de R$3 bilhões do BNDES, permitem dinamizar o setor. Isso sem falar nos R$500 milhões que estão sendo investidos no desenvolvimento de tecnologia e pesquisa, como a de células-tronco.

Na relação entre União, estados e municípios, o ministério, focado na otimização da gestão, implementou em junho uma inovação na administração de obras, reformas e ampliações de unidades de saúde, transferindo para a Caixa Econômica Federal a responsabilidade pelas construções e repasse de recursos. Uma solução criativa para problemas que se arrastavam por anos. Estamos incentivando também a entrada dos municípios para o chamado Pacto de Gestão. Ao aderir, o município assume a plena gestão das ações de saúde. Assim, serviços que estavam a cargo dos estados migram para esses gestores, atendendo às demandas locais com mais eficiência. No país, 2.571 municípios já aderiram ao pacto.

Enquanto nos movimentamos, enfrentamos no Congresso o grande desafio que é a aprovação do projeto das fundações estatais, que oferece uma estrutura mais dinâmica para a gestão de hospitais. Faz um ano que o governo federal encaminhou o texto. Em junho, obtivemos a primeira vitória, com a aprovação pela Comissão de Trabalho da Câmara. Mas ainda há um longo caminho a percorrer.

O SUS completa 20 anos, tempo suficiente para que possamos analisar os ganhos e desafios acumulados. Pontos fortes para o enfrentamento dos problemas estão definitivamente na agenda do Ministério da Saúde.

JOSÉ GOMES TEMPORÃO