Título: Dilma era maior alvo de lobistas do Opportunity
Autor: Galhardo, Ricardo; Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 24/07/2008, Economia, p. 26

Escutas revelam que suposto grupo a serviço de Daniel Dantas tentou se aproximar da ministra, mas foi rechaçado.

SÃO PAULO. Escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal (PF) com autorização judicial na Operação Satiagraha, às quais O GLOBO teve acesso, mostram que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, era o principal alvo no governo da suposta quadrilha encabeçada pelo banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.

As gravações detalham como lobistas a serviço de Dantas, como o publicitário Guilherme Sodré, o Guiga, e o ex-deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh, tentavam se aproximar da ministra para pedir ajuda do governo para viabilizar a supertele. Para isso, usavam o bom trânsito de Greenhalgh, consultavam colaboradores da ministra para sondar seu humor e contavam com ajuda até da oposição para agradar a Dilma. Guiga e Greenhalgh são alvo de inquérito da PF, que apura suspeitas de tráfico de influência.

Os grampos mostram também que a ministra evitava tratar do assunto com Greenhalgh e fechou as portas de seu gabinete para o grupo de Dantas.

Em conversa gravada às 10h14m do dia 13 de março, Greenhalgh diz a Guiga que Dilma se recusou a recebê-lo. "Ontem estive na capital e tentei conversar com a minha amiga e recebi um não. Ela mandou o secretário dela dizer que só quer me ver e falar comigo no dia 24", disse o ex-deputado petista.

Segundo Greenhalgh, a ministra passou a evitá-lo: "Eu estava em um lugar onde haveria uma solenidade com a presença do presidente e ela era para vir. Quando recebi o recado que ela não queria falar comigo eu pensei, bom, ela está nervosa, mas fiquei lá e disse ao rapaz que é secretário dela que eu estaria no local. Sabe o que aconteceu? Ela não foi ao local".

No dia 24 de março, às 9h05m, Guiga telefonou a uma pessoa identificada como Bernardo. O publicitário deveria acompanhar clientes em uma reunião com a ministra naquele dia, mas estava preocupado com o humor de Dilma em relação ao episódio em que foi levada por Guiga para passear no iate de Zuleido Veras, dono da Gautama e pivô da Operação Navalha: "Deixe eu lhe pedir uma consulta de amigo. Tem uma consulta hoje às 14h30m do pessoal do leite Longa Vida com a ministra Dilma Rousseff. Eles são meus clientes e me chamaram para ir. Eu não quero criar problema para mim e muito menos para ela. Não sei como é a temperatura dela em relação a mim. Depois daquele episódio nunca mais estive com ela", disse ele.

Bernardo respondeu que procuraria o secretário-executivo-adjunto do ministério, Giles Camiconde Azevedo, para sondar o humor de Dilma.

Greenhalgh: valor discutido não se refere a lobby

Até o senador Heráclito Fortes (DEM-PI), um dos mais ativos opositores ao governo, pode ter sido usado pelo grupo de Dantas para agradar à ministra. Em gravação feita às 18h07m do dia 28 de março, Guiga disse que o senador defendeu publicamente Dilma no caso do dossiê sobre os gastos com cartões corporativos no governo Fernando Henrique Cardoso em deferência a Greenhalgh. Heráclito não comentou a questão.

A assessoria da Casa Civil não comentou os diálogos.

Já Greenhalgh confirmou ontem que participou de diálogo grampeado pela PF, que trata de pedido de comissão de US$260 milhões, divulgado ontem pelo GLOBO. Ele nega, no entanto, que o montante seria para a remuneração de lobby em defesa da fusão da Brasil Telecom e da Oi e, possivelmente, para caixa dois de campanha eleitoral, como afirma a PF em relatório.

"O diálogo em questão tratava de uma negociação em curso, e os valores citados se referiam a essa negociação como um todo. Não há no diálogo nenhuma menção à tentativa de lobby. Mas a conclusão distorcida do relatório do delegado Protógenes Queiroz (responsável pelas investigações até a semana passada) é que esse valor se destinava a remunerar tráfico de influências", afirma Greenhalgh em nota.

Saques no Opportunity já passam de R$2 bilhões

Desde que foi deflagrada a Operação Satiagraha, segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), disponíveis no seu site, já superou a barreira dos R$2 bilhões o volume de perdas registrado nos fundos de investimento do Opportunity. Somente a aplicação Opportunity Portfolio Fundo de Investimento Curto Prazo já perdeu, do dia 7, véspera do escândalo, até ontem, R$1,3 bilhão.

Os resgates no período superam os de 2004, quando Dantas foi alvo de investigação da PF na Operação Chacal.

COLABOROU Liana Melo